A proposta de reforma administrativa, que entre outros pontos prevê a correção de distorções salariais do funcionalismo público, em tese, vale para os três poderes. Inclui, portanto, Legislativo e Judiciário, onde o volume de salários que furam o teto legal é maior, além de Estados e municípios.
– A intenção é essa, precisa ver como será feita. Pode ser contestado, porque pode ferir o conceito de independência entre os poderes. É importante que a reforma seja abrangente e válida também para o Legislativo e Judiciário, mas se isso não é construído em conjunto, equivale a uma iniciativa política que, se for derrubada, será inócua – diz Marcelo Marchesini da Costa, PhD em Administração Pública e Política pela University at Albany e professor do Insper.
A vedação constitucional de vantagens e benefícios distorcidos é apontada por Marchesini como um dos principais pontos positivos da reforma. Diz que faz todos sentido a maior flexibilização e mobilidade entre diferentes órgãos do setor público. O especialista em administração pública também aprova o ajuste no "fragmentado" sistema de cargos. São 150 planos de carreiras distintos, com cerca de dois mil cargos e 250 formas de remuneração.
– Há muitas funções semelhantes tratadas de forma diferente. Por exemplo, há assistentes administrativos em vários órgãos, ganhando salários muito diferentes.
Além dos pontos positivos, Marchesini critica o que considera "falta de diálogo na construção dessa proposta". Aponta desconexão entre os poderes e com os próprios servidores. Também vê risco na concentração de poder na Presidência da República, que ganharia poder de extinguir cargos, órgãos, reorganizar autarquias e fundações.
– Há um sistema de governança que precisa ser observado. Nem em empresas privadas a extinção de uma subsidiária, por exemplo, depende apenas do principal executivo. Precisa alinhar com a diretoria, o conselho de administração.
Marchesini alerta também que há risco no coração da reforma – a criação de cinco regimes de contratação, com a convivência dos atuais servidores, todos estáveis, com novos, muitos sem estabilidade. E detalha:
–Em uma mesma equipe, haverá pessoas com estabilidade e outras sujeitas a avaliação de desempenho. Sem gestão muito profissional, treinada e capacidade, pode criar ambiente de trabalho extremamente tóxico. Isso também pode ocorrer com os novos contratados sob o vinculo de experiência. Como a ideia é de que ainda estejam em avaliação, e sejam contratados apenas os melhores, podem ficar sujeitos a coação e pressão política. Fico imaginando como vai ser gerir um órgão público nessas circunstâncias.