Não só pelas duas paralisações na bolsa de valores antes do meio-dia, mas pelo impacto na cadeia produtiva, a crise econômica global deflagrada pelo coronavírus já deveria ter sido alvo de mais esforços do governo brasileiro do que se viu até agora. O Banco Central (BC) tem feito seu papel, reduzindo a velocidade da alta do dólar, mas ainda é pouco perto do tamanho dos problemas que a crise embute. E isso não quer dizer tentar transformar tsunami em marolinha, como fez o governo Lula em 2008, adiando uma conta que, quando chegou, ficou ainda maior e acabou desembocando na recessão de 2015 e 2016.
Em Miami, no mesmo dia em que Donald Trump anunciava as primeiras medidas de estímulo à economia – que até agora não saíram, mas ao menos ele entendeu o tamanho do problema –, o presidente Jair Bolsonaro considerava a crise do coronavírus uma "fantasia". O ministro da Economia, Paulo Guedes, admitiu que a revisão do crescimento do Brasil para 2020 divulgada na véspera, de 2,4% para 2,1%, era para inglês ver. Reconhece que o crescimento pode repetir a frustração de 2019, avançando apenas 1%.
Para quem tem muitas crises no currículo, como o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, o governo está "paralisado". Alerta que a crise põe em risco o capital de giro das empresas e o pagamento em dia das contas dos cidadãos. Fervoroso defensor do ajuste fiscal, ele avalia que é preciso adotar medidas responsáveis, mas eficientes. A melhor estratégia, avalia, é pôr "dinheiro no bolso das pessoas".
A turbulência no mercado financeiro se agravou no Carnaval, mas quem já viu esse filme antes sabe que as consequências de ataques de nervos dos investidores vão muito além de quem negocia com ações. Negociações na bolsa e no câmbio têm sua lógica particular, mas tentam antecipar o que vai ocorrer mais à frente. Com três semanas de turbulência acumuladas, o custo da crise começa a ficar mais claro. Passou da hora de o governo Bolsonaro abandonar a estratégia da lacração e mostrar seu valor. Medidas do Planalto não vão dissolver a crise global, mas podem reduzir consideravelmente os estragos no Brasil.