Quedas superiores a 4% nas bolsas europeias e a 3% na de Nova York, como se vê na manhã desta segunda-feira (24), não são comuns no mercado financeiro internacional. São tombos só testemunhados em períodos muito críticos, em geral associados a crises globais. Além da pista dada pela dimensão das perdas, há outras. Ativos considerados refúgios em períodos de crise têm forte valorização, como o ouro que alcançou cotação máxima em sete anos. E os diretamente relacionados à velocidade do crescimento têm queda, como o petróleo, que assiste ao declínio de 4% no preço do barril de referência, o brent.
– Os mercados mundiais caem fortemente hoje com a perspectiva que o coronavírus está fora de controle – interpreta o economista-chefe da Necton, André Perfeito.
No Brasil, a bolsa só reabre na Quarta-Feira de Cinzas (26), mas um índice que replica o Ibovespa negociado no Exterior, chamado EWZ, cai 4% no final da manhã desta segunda-feira (24). Segundo Perfeito, pode haver uma boa notícia na reação tão aguda do mercado financeiro:
– Devemos ver realização (perda) rápida, uma vez que esse tipo de evento tende a bater forte e de uma vez nos mercados, mas na medida em que os suportes (cotações mínimas projetadas no período) sejam rompidos, o medo pode avançar entre os investidores, realimentando a crise.
Na origem da onda de aversão ao risco, está a disseminação dos focos de surto de coronavírus na Coreia do Sul, onde forçou a paralisação da fábrica da poderosa Samsung, no Irã, o que provocou o fechamento da fronteira com a Turquia, e especialmente na Itália, com interrupções pontuais do fluxo de pessoas com Áustria e França, habitualmente livre. Ou seja, está claro que o problema não se restringe mais à China.
Mas um dos efeitos mais temidos do surto de coronavírus ainda tem epicentro na China. Perdas, mesmo substanciais, nas bolsas podem ser recuperadas, ou sequer realizadas por muitos investidores. No entanto, a hipótese de prejuízos na economia real nunca esteve tão perto de se concretizar, tanto com paralisações nas gigantes Apple e Samsung, quanto por reflexos no ritmo de todas as cadeias industriais do mundo.
Seria resultado da combinação da Chinadependência desenvolvida nas últimas décadas com a estratégia de produção "enxuta", ou seja, sem estoques caros e de difícil gestão. Esse efeito já atingiu indústrias eletroeletrônicas gaúchas, que têm perspectiva de volta à normalidade se a produção chinesa de fato retomar o ritmo normal, o que ainda depende de confirmação.