Três entidades empresariais do Rio Grande do Sul – Fiergs, Fecomércio e Farsul _ publicaram nota, nesta quinta-feira (26), defendendo retomada das atividades produtivas em prazo curto. O pedido é para que possam operar com 50% de pessoal nas suas atividades já a partir de 1º de abril, dentro de pouco mais de sete dias, e retomada total em 6 de abril, "quando o isolamento horizontal já terá cumprido 16 dias".
No fundo, trata-se da discussão que vem sendo estimulada pelos presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e do Brasil, Jair Bolsonaro. Até agora, nenhum outro chefe de Estado aderiu a esse discurso. Ao contrário, repetem o mantra "fiquem em casa". A preocupação é se o tratamento – o esforço de adiar o pico da hospitalização, dando tempo para reforçar o sistema de saúde, mas alongando o período de restrições – vai provocar mais estragos do que doença, com quebra de empresas, desemprego e aumento do abismo social.
A preocupação e o debate são legítimos. Um dos argumentos das três entidades empresarias faz todo sentido: "É preciso levar em conta as cadeias de fornecedores que, mesmo fora da área de saúde e alimentar – consideradas exceções de segmentos industriais e comerciais –, são essenciais para que o produto final exista, em uma cadeia que não pode ter nenhum elo quebrado. A lógica é de que de nada adianta o campo produzir se o resultado não chegar ao consumidor. A coluna já destacou a necessidade de dar suporte à a logística, e o governo do Estado ajustou as regras para permitir que o abastecimento não seja prejudicado. Isso é essencial.
Mas há outras questões que precisam ser pesadas. Em primeiro lugar, a doença causada pelo coronavírus, a covid-19, ainda é alvo de controvérsia até entre os especialistas. Há poucas certezas. O que existe é a constatação baseada em experiências anteriores, por sua vez desenvolvidas no mais antigo sistema de aprendizagem: tentativa e erro. Para a maioria dos infectologistas, o isolamento vertical é eficaz em locais em que o contágio é pontual, em Estados, regiões, cidades, bairros. Não é o que ocorre no Brasil, que já teve mortes no Amazonas e no Rio Grande do Sul. Eduardo Sprinz, chefe do serviço de infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, faz duas indagações:
– Quem garante que a doença aqui será como em outros lugares, porque temos jovens gravemente doentes? Quem garante que os jovens não entrarão em contato com pessoas mais expostas a complicações?
O especialista estima que, em duas ou três semanas será possível ter uma ideia mais precisa de como a pandemia vai se comportar no Brasil. Ainda não temos UTIs lotadas. O número de mortes ainda não entrou na fase exponencial aguda que outros países já testemunham, com cenário desolador. Se tudo der muito certo, evitaremos o pior quadro.
Empresários que preferem não se expor à polêmica ponderam que uma retomada nos parâmetros do isolamento vertical e remontar escalas com base nesse critério será outro desafio. Executivos que têm a proteção às pessoas como principal objetivo estimam que o prazo de um mês é razoável para rediscutir as regras.
Como as pessoas vão sobreviver? Passou da hora de o poder público ajudar, com urgência e consistência. Não com R$ 200, mas com ações realmente efetivas. Ajudar as empresas a sobreviver e garantir renda dos trabalhadores, ajudar quem já não tem emprego formal. Fazer a sua parte, já que muitos brasileiros estão comprometidos a dar sua contribuição, por menor que seja.
O Brasil não está em lockdown, caracterizado pela proibição expressa de sair de casa, com punições para quem descumprir a ordem. Há uma recomendação de ficar em casa, cumprida com disciplina surpreendente em um país gregário como o Brasil. Quem tem de definir o tempo de retomada da atividade, levando em consideração os melhores interesses sanitários e econômicos, conciliados, não opostos, são as autoridades da saúde. E já não será fácil.
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