Em um governo que gasta muita energia e demasiado tempo criando polêmicas e desgastes desnecessários – como a recriação dos ministérios da Cultura e da Segurança Pública –, as declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes em Davos são apenas mais um episódio. Ao trazer para o debate público um conceito acadêmico, o do "imposto do pecado", Guedes fez o debate da reforma tributária recuar cem casas.
A conversa já não é fácil. Existem dois projetos em discussão, um na Câmara, outro no Senado. Ao apresentar o pacote de três propostas de emenda constitucional (PECs) e outros mecanismos, no início de novembro, o próprio Guedes havia anunciado que havia desistido de apresentar uma proposta própria de reforma tributária. E confirmou em dezembro. Pelo que disse em Davos, mudou de ideia.
Ao mencionar o "imposto do pecado", Guedes discorreu sobre um estudo que encomendou à equipe sobre impostos seletivos. Claramente, tenta aumentar a arrecadação, o que o então candidato Jair Bolsonaro prometeu que não faria – e nesta sexta-feira, na Índia, reiterou que não o fará, embora de maneira um tanto, digamos, informal. Cigarro e bebidas alcoólicas já pagam sua tarifa de vício: os fumantes pagam quase 80% a cada cilindro queimado, e as alíquotas sobre vinho e cerveja já passam da metade do copo.
A única novidade seriam os "açucarados", que incluiriam refrigerantes, sorvetes e chocolates. Dos três, só há relativa unanimidade sobre as "externalidades negativas" (danos à saúde) sobre o primeiro. No sorvete, a gordura hidrogenada da maioria das marcas industriais causa mais problemas do que o açúcar. E chocolate com alto teor de cacau é até recomendado como alimento saudável. Haveria um debate infindável sobre a natureza delituosa de cada produto.
Enquanto isso, há pecados unânimes na estrutura tributária brasileira que exigem redenção urgente. Os impostos brasileiros são regressivos, isso é, fazem com que os pobres paguem proporcionalmente mais do que os ricos. Provocam distorções produtivas – mercadorias circulam pelo Brasil apenas para capturar vantagens fiscais. Não bastasse a estrutura já complexa e burocrática, a cada ano surgem milhares de novas normas, instruções e portarias. Até agora, o Planalto só apresentou propostas para resolver o próprio problema de caixa. A reforma tributária permite aliviar a atividade econômica privada, ainda que a médio prazo. A cada nova polêmica desse tipo, perde-se tempo e energia sem necessidade. É hora de fazer foco, se o Brasil quiser a atenção dos habitués de Davos.