Não são poucas as vozes que já se levantaram para apontar o obscurantismo do governo Bolsonaro. Nesta semana, um limite grave foi cruzado. O inacreditável vídeo gravado pelo secretário da Cultura, Roberto Alvim, foi defendido por seu autor, na manhã desta sexta-feira (17), em entrevista à rádio Gaúcha, como uma "coincidência retórica".
Sobre a declaração decalcada do discurso do ministro nazista Joseph Goebbles, afirmou que "a frase em si é perfeita". Agora, é a imagem do Brasil como um país minimamente civilizado que está em jogo. A inaceitável recriação da propaganda nazista já está em todos os principais jornais do mundo, como os americanos The New York Times (neste link) e Washington Post (ver aqui), a TV britânica – e global – BBC (outro link) e sites focados no mercado financeiro global, como a Bloomberg (mais um link).
Desde o episódio das queimadas na Amazônia – não pelo fogo em si, mas pela reação do governo ao problema, que misturou desprezo ao ambiente e à ciência –, a visão sobre o Brasil no Exterior está em xeque. Com exceção de uma visita amistosa à China, para apagar o discurso agressivo da campanha, nada foi feito para mudar a percepção externa. Depois do vexame do ano passado, quando sequer usou o tempo de que dispunha para "vender" o Brasil diante de alguns dos mais poderosos investidores do planeta, neste ano o presidente Jair Bolsonaro preferiu não ir ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.
Não faltaram recados de parceiros internacionais. Em visita a Porto Alegre, o chefe da delegação da União Europeia ao Brasil, Ignácio Ybañez, com habilidade diplomática, fez questão de mencionar as diferenças de visão entre o governo brasileiro e os governos europeus, candidatos a formar o maior bloco comercial do planeta com o acordo Mercosul-União Europeia. Só nesta semana, ficou claro que o governo despreza dados e cuidados ambientais, Bolsonaro demonstrou tolerância a comportamentos profissionais reprovados na iniciativa privada, e ensaiou até ser leniente com extremismos, ao levar Alvim para sua transmissão ao vivo em uma rede social depois da publicação do lamentável vídeo.
Tudo isso ocorreu exatamente na semana em que o governo federal expôs publicamente seus planos de concessão de serviços e privatização de empresas, contando com capital externo nos dois casos. Embora haja muito dinheiro amoral circulando pelo mundo, fontes oficiais de recursos têm princípios. A imagem desgastada do governo brasileiro é apenas parte do cenário que provocou, em 2019, o maior saldo negativo da entrada e saída de dólares do Brasil. Este é um momento de inflexão. O eco nazista ensaiado no vídeo do secretário é um limite ético. Se for aceito, o Brasil pode ter como pares, aos olhos do mundo, as ditaduras mais malvistas da África.