Ele apresentou credenciais ao presidente Jair Bolsonaro no início de outubro e, um mês depois,
já estava em Porto Alegre. Ignacio Ybañez é o novo chefe da delegação da União Europeia (UE)
no Brasil, cargo que equivale ao de embaixador. No início de dezembro, Ybañez coordena na capital gaúcha uma reunião de embaixadores de países do bloco para conhecer melhor o Estado e anunciar um novo formato de cooperação cultural em Porto Alegre. Otimista com o o acordo com o Mercosul, afirma que ambiente, cultura e direitos humanos são valores da União Europeia.
O acordo UE-Mercosul pode travar?
O acordo vai bem, estamos fazendo as revisões, porque há muitos detalhes técnicos, muitas listas que têm de ser aprovadas. É um trabalho que desejamos finalizar relativamente rápido. A ideia é finalizar a parte técnica no próximo ano. Depois, a Comissão Europeia apresenta o texto pronto ao Conselho Europeu, que, ao aceitar, começa o processo de ratificação. Primeiro vai ao Parlamento Europeu e, depois, aos dos países-membros.
Há segurança de que será aprovado?
É verdade que alguns países têm dúvidas, mas muitas não são propriamente sobre o acordo. Por exemplo, o parlamento tcheco queria que preservação do ambiente, aplicação do Acordo de Paris e proteção da Amazônia fossem incluídos. São elementos importantes para a União Europeia, mas até por isso já estão no acordo, uma parte importante é a ratificação, por ambas as partes, de uma série de valores e compromissos. Um é o de fazermos parte do Acordo de Paris. Muitas perguntas que os parlamentos podem vir a fazer já estão previstas. Sou otimista, no Brasil tive a possibilidade de falar com integrantes do Parlamento. É verdade que uma discussão política é importante, assim como fazer uma boa explicação do acordo. Uma ideia que estamos trabalhando com o Itamaraty é fazer uma apresentação conjunta. Estive várias vezes com o ministro Pedro Miguel Costa e Silva, chefe da negociação por parte do Itamaraty. É importante explicar que vai trazer grandes possibilidades para todos. E sobretudo, combater a ideia de que vai ser muito bom para o agronegócio brasileiro e muito bom para a indústria europeia e muito ruim para o agronegócio europeu e muito ruim para a indústria brasileira.
O Brasil é o país que mais recebe recursos para pesquisa da UE, porque, do ponto de vista de infraestrutura, tem nível mais alto na América do Sul.
Como vê a crítica de que o acordo é apenas comercial?
Um bom exemplo são os investimentos em pesquisa que a UE faz na região. Nessa área, o que pudermos contribuir para ajudar os pesquisadores será bom para as duas partes. O Brasil é o país que mais recebe recursos para pesquisa da UE, porque, do ponto de vista de infraestrutura, tem nível mais alto na América do Sul. Os brasileiros gostam muito de ver os pontos negativos, mas também é preciso ver os positivos. Podem ser pequenas ilhas de excelência em pesquisa, mas existem.
O episódio da Amazônia colocou o acordo em risco?
Sou um diplomata, não vou qualificar políticos europeus nem os brasileiros. Na Europa, já superamos a época em que não podíamos falar dos desafios ambientais como internacionais. Os desafios ambientais são globais por definição. Para os países europeus, a questão ambiental é tão fundamental que tem de ser essencial na relação com um parceiro tão importante como o Brasil. É bom insistir, vai haver comentários sobre a situação do ambiente em países específico, mas não será um ataque à soberania nacional. No verão da Europa, houve queimadas na Espanha e em Portugal, e políticos de outros países da UE manifestaram preocupação. Isso não foi visto como um ataque à soberania desses países. A UE tem esse perfil de oferecer cooperação, está muito alinhada ao princípio de solidariedade. Caso Espanha ou Portugal não tenham meios suficientes para resolver a emergência, pedem ajuda. A oferta da UE segue, se o Brasil quiser contar com nossa ajuda, financeira ou de equipes, nossos países têm enfrentando os desafios do fogo, estamos preparados. Isso não quer dizer que tenhamos dúvidas sobre a soberania brasileira. É verdade que a situação foi tensa, mas as coisas estão melhores. A linha de cooperação que temos é respeitosa.
Podemos analisar como ajudar a Argentina. O que não podemos fazer jamais é reabrir a negociação, que foi muito dura.
Há preocupação com o futuro do Mercosul, dada a relação entre Argentina e Brasil?
Lógico que temos particular interesse no acordo, pois é bom para as duas partes. Quando apresentei credenciais ao presidente Bolsonaro, ele disse que a grande prioridade para o seu governo é o acordo. Desse ponto de vista, quando um novo governo toma posse na Argentina, também vai compreender a importância do acordo e serão parte disso. Alberto Fernández (presidente eleito da Argentina) tem dúvidas. Podemos analisar como ajudar a Argentina. O que não podemos fazer jamais é reabrir a negociação, que foi muito dura.
O que os embaixadores europeus vêm fazer no Estado?
Por um lado, permitir que conheçam o Rio Grande do Sul. E há possibilidade de o Estado se apresentar a 24 embaixadores, assim como empresas, entidades empresariais, sociedade civil e universidades. É um esforço para melhorar a relação. O Brasil é um país tão grande que existem muitas especificidades em cada região. Fazemos grande esforço no para desenvolver a cooperação do Brasil com centros culturais dos países da União Europeia. Agrupamos todos os centros culturais de todos os Estados-membros. Temos em Brasília, Curitiba, Salvador, São Paulo, Rio de Janeiro. Agora, vamos criar em Porto Alegre. Ambiente, cultura e direitos humanos são áreas muito importantes para nós.