No comando da consultoria internacional InterB, Claudio Frischtak é interlocutor frequente de interessados em investir no Brasil. Para a coluna, o economista que se diz "100% a favor de privatizar" detalha o que vem preocupando os potenciais candidatos às privatizações e lamenta os "danos à imagem" do país provocados pelo próprio governo.
Em que prazo devem ocorrer as primeiras vendas?
Qualquer processo de privatização é complexo. Tem fatores políticos, pois precisa de apoio da sociedade, viabilidade jurídica, obviamente vai haver guerra de liminares, necessita modelagem robusta para gerar os ganhos esperados, não tanto os fiscais, mas para a sociedade, que são mais amplos. Estamos falando de um a três anos. Se olharmos para o conjunto de estatais, é uma década.
A lista teve poucas surpresas?
É, em primeiro lugar uma resposta política à pressão. Sou 100% a favor de privatizar, a questão é a modelagem, para ter ganho efetivo para a sociedade. Estamos falando de melhoria dos serviços a preços competitivos. Nossas estatais foram capturadas por sindicatos, governantes, interesses políticos e fornecedores. Quem não capturou foi a população. Foram privatizadas, sem ter esse nome, para interesses particulares.
Como está o humor dos investidores estrangeiros?
Existe diferença entre o investidor em papel, que compra e vende ações, e os que vêm comprar ativos reais e vão ficar aqui por muitos anos. Para esses, questões relativas a clima político, segurança jurídica e previsibilidade regulatória são muito importantes. Infelizmente, a própria Presidência tem sito muito errática nos pronunciamentos, nas ações e sinalizações e isso é muito ruim. Há falta de compreensão da importância de seguir regras globais de bom comportamento, seja em ambiente ou direitos humanos, pois as empresas que vêm investir no Brasil têm conselhos que seguem normas de compliance que dizem que só devem investir em países "assim, assim, assado". Então, o governo tem dado tiros no próprio pé, quando, de forma impensada e ideologizada, fala e afirma certas coisas que não adicionam, só têm custo e não têm benefício. O dano que a questão do Fundo Amazônia está trazendo para nossa imagem lá fora é muito grande, acho que não têm noção disso. É claro que quem investe em infraestrutura está preocupado com a situação da Amazônia. O governo, mais especificamente a Presidência, o Ministério de Meio Ambiente e o de Relações Exteriores não tem cuidado em preservar a imagem do país. Não se pode ter arroubos, acaba causando grande dano ao país. Afasta determinados investidores, reduz propensão para fazer prospecção. Atualmente, a imagem do Brasil não é boa, e isso não tem nada a ver com outros países, é nossa própria culpa.
Qual a percepção que domina, a da oportunidade ou a do risco?
Existem forças contrastantes. Por um lado, o Brasil é um país com 210 milhões de pessoas, é um território muito grande, é um país que tem muita coisa a ser construída, com excesso de demandas e com retornos ainda atraentes. Isso gera interesse. O outro lado dessa moeda é que a economia global hoje está incerta. Esse elevado grau de incerteza faz com que muitos investidores acabem fugindo para ativos seguros, dólar, bônus dos governos americano e alemão, hoje há US$ 15 trilhões aplicados com retorno baixo ou negativo. Há temor de recessão global, e busca de refúgio em ativo seguro, mesmo que o retorno seja baixo ou negativo. Aqui, nós devemos fazer o drver de casa de A a Z e não só o ABC. Precisamos construir a imagem de reformas, de um país que respeita contratos, tem maior grau de previsibilidade regulatória, e o governo nem sempre faz isso. O Congresso aprovou uma excelente lei sobre agências reguladoras, o presidente vetou artigos. Isso gera desconforto. Ao dizer 'quem manda aqui sou eu', passa imagem ruim. Então, temos o ministro Paulo Guedes se esforçando para que o país volte a crescer e do outro, no mesmo governo, tem alguém sistematicamente dando tiro no pé. Como no regime presidencialista, o presidente tem muito poder, os investidores querem saber o que ele pensa, não bastam os ministros. E nem sempre o que presidente fala repercute bem, nem sempre o que o ministro Ricardo Salles fala repercute bem. Ao contrário, na maioria das vezes repercute mal. Nem sempre o que o ministro Ernesto Araújo fala repercute bem. Há grupo no governo muito ideologizado, que, no fundo, atrapalha. Os ganhos da reforma são parcialmente subtraídos por esse núcleo ideologizado. Muita gente aqui de fora entende, lá dentro não sei.