As ameaças do presidente da França, Emmanuel Macron, que começaram com a inclusão do debate sobre as queimadas na Amazônia para a reunião de cúpula do G7, estenderam-se ao acordo de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia. Acusou o presidente Jair Bolsonaro de "mentir" na reunião do G20 em Osaka, no Japão, e sob essa alegação, avisou que agora se opõe ao tratado. Foi rapidamente seguido pela Irlanda. Esses dois países foram os que mais ofereceram resistência às negociações, especialmente a ampliação do mercado da Europa à produção agropecuária de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. Portanto, não é um acaso.
É óbvio que Macron não está interessado apenas em preservar a Amazônia. Trava uma batalha por poder e por popularidade, especialmente em seu país, mas também diante de seus pares. O problema é que o presidente Jair Bolsonaro abriu as portas para sua estratégia.
Nesta sexta-feira, Macron vai receber o imprevisível Donald Trump em Biarritz, praia ao sul do país, na baía de Biscaia (do outro lado do Mediterrâneo), sede do encontro dos chefes de Estado dos sete países mais ricos do mundo. Nesta sexta-feira, enquanto o Brasil tenta apagar o incêndio que consome a imagem do país lá fora, Trump já entrou em conflito com o presidente do banco central de seu país, ameaçou re-retaliar a China e substituí-la como parceiro comercial. Em reação, bolsas despencam e o dólar se valoriza no mundo todo, mas a moeda que mais perde é o real.
Consultado pela coluna, Welber Barral, consultor e ex-secretário de Comércio Exterior do Brasil avalia que não há risco real de que o acordo UE-Mercosul simplesmente vá para o vinagre, mas adverte:
– Pode haver atrasos substanciais enquanto o governo brasileiro não assumir compromissos efetivos de redução de queimadas.
Barral pondera que Macron está jogando para o público interno:
– Criticar a situação lhe dá ganhos políticos com os grupos ambientalistas e com o setor agrário na França.
– O que foi concluído no âmbito das negociações a nível técnico ainda está sendo revisto, e só depois de discutido e eventualmente aprovado pelo Conselho Europeu, é remetido ao Parlamento europeu. Esse bate-boca sobre as queimadas na Amazônia é mais um elemento irritante na busca do entendimento entre UE e Mercosul.
Graça Lima, que chegou a ser cotado para ocupar o Ministério das Relações Exteriores no governo Bolsonaro, avalia que o acordo UE-Mercosul "pouco contribui para os objetivos de liberalização do comércio exterior brasileiro e de melhores condições de acesso aos produtos do nosso agronegócio". E justifica:
– Do pouco que se conhece da parte de acesso, dá para concluir que uma efetiva redução do custo de bens e serviços procedentes da UE só vai ocorrer em 10 ou 15 anos, a partir de 2021.