A primeira conexão entre a Operação Lava-Jato e a investigação que desembocou na prisão do ex-presidente Michel Temer e o ex-ministro Moreira Franco surgiu em uma análise da troca de e-mails de executivos da Engevix sobre negociações de contrato da Usina Angra 3. A Ecovix, empresa controlada pela Engevix com participação de um fundo ligado à Funcef, entidade de previdência complementar da Caixa Econômica Federal, havia tido uma surpreendente vitória na licitação federal para ocupar o Estaleiro Rio Grande, principal estrutura do polo naval gaúcho. Em material apreendido pela Lava-Jato há quatro anos, quando se investigava a participação da empresa no cartel de empreiteiras montado para fraudar licitações da Petrobras.
Em um dos e-mails analisados, enviado em agosto de 2014, surgiu pela primeira vez o nome do coronel aposentado da PM paulista João Baptista Lima Filho, o coronel Lima. Um dos donos da Engevix, José Antunes Sobrinho, recomenda a dois funcionários da empresa, Samuel Fayad e Wilson Vieira, com cópia para os sócios Gerson Almada e Cristiano Kok, que "se precisarem de alguma ação minha com o Othon (ex-diretor-presidente da Eletronuclear Othon Luiz Pinheiro da Silva) ou com AF/Lima, por motivos óbvios de minha relação, conhecimento do setor e histórico, podem contar comigo".
A "AF" era a finlandesa AF Consult, e "Lima", apurou a Lava-Jato, o amigo e assessor informal de Temer. A AF e a Argeplan, empresa do coronel, tinham contratos na obra da usina nuclear Angra 3, no Rio, que envolvia R$ 162,2 milhões em maio de 2012 (atualizados pelo IPCA, R$ 239,4 milhões hoje). As duas eram parceiras da Engevix. A partir daí, a investigação se desdobrou até chegar às prisões de Lima e Temer, nesta quinta-feira (21).
A Ecovix pediu recuperação judicial, aprovada em 26 de junho do ano passado, e pouco se moveu desde então. A Engevix hoje é só de Antunes Sobrinho, que pagou, para ficar de único dono, R$ 1 a cada um dos sócios, além do pagamento das defesas no âmbito da Lava-Jato.
A empresa é citada várias vezes no despacho do juiz Marcelo Bretas que determinou a prisão:
"Plausível a conclusão do órgão ministerial de que coronel Lima atua como uma espécie de mandatário de Michel Temer, sendo há décadas homem de confiança do ex-presidente da República, além de atuar nas relações comerciais entre Temer e empresários da construção civil (a exemplo da Engevix), bem como do setor portuário (narrado na denúncia do Quadrilhão do PMDB)" e "o coronel Lima o procurou informando que ele deveria fazer doações para a cúpula do PMDB. Contudo o colaborador (Sobrinho/Engevix) apontou que não tinha margem nos seus contratos em andamento com a Eletronuclear (Angra 3) para acumular o montante. Note que, como parece, e foi revelado, pelo colaborador, sua empresa Engevix seguia realizando todo o projeto eletromecânico 1, enquanto parte dos valores pagos pelo contrato com a Eletronuclear já eram direcionados à empresa Argeplan, sócia formal da AF Consult do Brasil. Para atender ao pedido de R$ 1.000.000,00 (um milhão) feito pelo coronel Lima, Sobrinho assevera que tentou obter recursos com Moreira Franco, com quem tinha bom relacionamento, por meio dos contratos ligados à Secretaria de Aviação Civil, de responsabilidade do segundo a época".