Prédio de alto padrão em Taquari. Edifício de 12 andares na horizontal Teutônia. Apartamentos de 10 metros quadrados em Porto Alegre. Por trás desses projetos inusitados, está uma nova empresa, a TSS, iniciais de Tiago Silva do Santos, 39 anos. Filho de pedreiro, o ex-jogador de futebol virou dono de incorporadora, levado tanto pela profissão do pai quanto por livros de magnatas dos tijolos como Donald Trump. Antes, passou pela experiência de jogar na Bulgária, no Litex Lovech. O time era dirigido, como descreve Tiago, por um dos "donos do país". No Leste Europeu, sabe-se o perfil desse tipo de cartola. Também passou pelo CSKA, de Sófia, capital do país, e pelo Genk, da Bélgica. Virou um raro empresário brasileiro que aceita o risco, construindo com recursos próprios.
– Estou preparado para quebrar – avisa, cada vez mais longe dessa ameaça.
Por que a construção civil apareceu como opção no pós-futebol?
Tenho na família uma relação com a construção civil. Meu pai, seu Manuel, já falecido, era pedreiro. Quando eu era pequeno, ia acompanhá-lo até o serviço. Via que ele trabalhava de forma artesanal, com carinho e entrega e, ao mesmo tempo, via as dificuldades que eram as construções na época. Era tudo braçal, com muito peso. Isso ajudou quando estava pensando na transição pós-futebol, para que me tornasse um incorporador. Nesse período em que estive na Europa, li muitos livros de diferentes áreas, biografias, livros de investidores. Entre essas tantas leituras, a da construção civil me chamou bastante atenção.
Como você foi morar na Europa?
Estava jogando no Fluminense. A Parmalat, a quem eu pertencia, estava saindo do futebol. Então meu empresário criou a situação para a Bulgária. Estava em um período em que tinha necessidade de estabilidade financeira, de contrato um pouco mais longo. No Brasil, os contratos tinham no máximo um ano, na época. Não tinha segurança. Fiquei em situação complicada. Investi na Fazendas Reunidas Boi Gordo (iniciativa que prometia retorno da engorda de gado e foi denunciado como esquema de pirâmide). A classe esportiva sempre é um meio em que circulam pessoas que tenham algo a comercializar. Fui convencido e acabei investindo. Com a quebra da Boi Gordo três meses antes de eu receber o retorno (do investimento), fiquei em situação difícil. Isso antecipou a para a Europa. No meu planejamento, era para ficar mais dois anos no Brasil e depois ser transferido para um mercado mais interessante.
Como foi a experiência na Bulgária?
Em um primeiro momento, foi assustadora, muito difícil. Morava no Rio de Janeiro, na Barra da Tijuca, e quando desci no aeroporto, vi aquele país todo cinza. Era inverno, fevereiro, fazia -17ºC. Depois tinha que andar uma hora e meia até o interior. Lá me apresentei e comecei a treinar. Eles tinham uma resistência bastante grande em relação a estrangeiros e um pouco por causa da cor, também. Não era um país internacionalizado. Os três primeiros meses foram de muito choro, de preparar a mala, sair na rua e os seguranças do clube irem até mim me atacar para que eu não fosse a lugar algum. A Bulgária é um país do Leste Europeu, onde há pessoas que comandam o país. Uma das que comandavam nosso clube também comandava o país, então a gente era muito monitorado. Até que se passaram aqueles três meses, retornei ao Brasil, e quando voltei para lá, comecei a ter imposição técnica. Com seis meses, já entendia a língua, compreendia o que o treinador falava. Mesmo tendo um tradutor cubano, ele não estava sempre presente. O país começou a me aceitar e passei a me envolver com a cultura do país. Isso fez com que eu permanecesse lá durante quase sete anos.
Por que você decidiu começar a investir no Vale do Taquari?
Havia retornado para o Juventude. A ideia era atuar um ano no time e, ao mesmo tempo, criar a incorporadora e começar a primeira construção. Taquari é minha terra mãe, as pessoas me conheciam do futebol. Na construção, seria uma novidade, mas ao mesmo tempo eu estaria ali dando confiança. As pessoas, talvez, teriam mais conforto para apostar na TSS.
Os três primeiros meses foram de muito choro, de preparar a mala, sair na rua e os seguranças do clube irem até mim me atacar para que eu não fosse a lugar algum.
TIAGO SILVA DO SANTOS
Empresário
De onde vieram os recursos para o primeiro empreendimento?
Foram próprios, recursos que adquiri com o futebol. Foi uma situação meio complicada financeiramente, porque tive que investir em toda a obra. No início, só apareceram dois clientes, por Taquari ser uma cidade com poder aquisitivo um pouco mais baixo. Então você tem de trabalhar com fluxo e entradas baixos, não consegue ter uma tabela mais alta. Então a obra foi 100% com recursos próprios.
O que leva você a escolher projetos com características fora do usual?
No período em que estava na Bulgária, Bélgica e na Itália, mas principalmente na Bulgária, era uma época em que estava começando a aparecer construções diferentes. Comecei a enxergar muita qualidade arquitetônica e diversidade de projetos. Depois disso, comecei a prestar atenção em outros países onde circulava, onde jogava ou ia passear. De lá, veio a ideia de que, no retorno ao Brasil, constituída a incorporadora, teria de fazer algo diferente do convencional.
Por que surgiu a ideia de fazer um prédio com estilo e tamanho japoneses em Porto Alegre?
Em 1999, fomos jogar a final do campeonato mundial pelo Palmeiras, na Copa Intercontinental, e ficamos em Yokohama. Ficava com um companheiro, na época o Roque Junior. Ele é comprido, eu também não sou tão pequeno, e os quartos eram de fibra, desde a cama até as paredes, o banheiro, tudo fibrado. Nossas pernas ficavam um metro para fora. Depois de entrar no mercado com produtos de qualidade e, arquitetonicamente, bastante bonitos, encontrei a região e o local certos para desenvolver esse projeto com características japonesas. A ideia é trabalhar com produtos de 10, 15, 30 e 45 metros quadrados, tudo muito funcional, com planejamento, porque vamos entregar as unidades mobiliadas. Por serem funcionais, vai ter bastante movimento nessas mobílias, então precisamos de muita qualidade.
Depois que criei a incorporadora e comecei a construir, minha ideia é chegar em nível de ter uma incorporadora butique.
TIAGO SILVA DOS SANTOS
Empresário
Qual o público alvo?
O jovem que vem de toda parte do Brasil, para estudar nas universidades ou fazer residência médica. E também todo aquele público que gosta de morada com conceito, em um bairro que não precisa de carro, pode usar a bicicleta que o condomínio vai oferecer. É no Bom Fim, onde está a maior densidade demográfica de Porto Alegre. As pessoas circulam muito, caminham muito, gostam de ir a bares e restaurantes.
Até hoje seus empreendimentos têm financiamento próprio, não há sócios?
Nossa incorporadora é limitada. Minha irmã tem uma participação pequena, e a gente vem construindo com recursos próprios. Até a terceira era com recursos próprios e a quarta, que estamos terminando em Taquari, o TSS Armênia, tivemos um fluxo alto de investidores e compradores. Com a marca se consolidando, estamos tendo aproximação de vários investidores que estão gostando dos nossos projetos "diferentões". A ideia da TSS é ela poder comportar três ou quatro investidores em cada obra, mas que eles invistam seja no terreno ou em unidades com valor especial para ajudar no start da obra.
Qual sua meta como incorporador?
Depois que criei a incorporadora e comecei a construir, minha ideia é chegar em nível de ter uma obra industrializada para que eu possa tão e somente gerenciar processos para chegar ao nível de uma incorporadora butique, onde vou fazer duas obras por ano, não mais que isso, e que a gente vá trabalhar com público exigente agregando aquilo que existe de melhor no mundo em termos de produto para a obra em si, materiais.
Se um dos motivos do interesse pela construção civil foi o fato do seu pai ser pedreiro, os canteiros de obra da TSS são diferentes dos demais?
Com relação aos demais, não diria, porque não venho acompanhando. Mas com certeza, dentro dessa industrialização que estou idealizando, vai entrar a facilidade de movimentação de materiais e de inovações. Lembro do meu pai carregando uma pedra de 20 quilos nas costas. Aquilo me tocou. Hoje estou trazendo inovações, importando da Espanha, da Alemanha, para que nossos colaboradores tenham qualidade com o auxílio de tecnologia na obra. Queremos que eles tenham mais esforço mental do que físico.