Ronaldo Bernardi, 43 anos de ZH, 58 prêmios de jornalismo, dedicou 40 horas de trabalho para conseguir a foto acima.
Adriana Irion, 26 anos de Zero Hora, mais de uma dezena de prêmios de jornalismo, dedicou 90 horas de trabalho para concluir a reportagem cujo título está reproduzido acima.
Os dois, Ronaldo e Adriana, são repórteres puros-sangues, combativos, incansáveis. Quando os encontro aqui na empresa, chegando ou saindo para uma reportagem, fico na expectativa: sei que teremos mais uma investigação com enorme repercussão.
E o que eles revelaram desta vez?
O padre Evair Heerdt Michels, investigado pela Polícia Federal por armazenar pornografia infantil, monitorado com tornozeleira eletrônica e proibido pela Justiça Federal de circular em eventos ou qualquer atividade onde haja crianças e adolescentes, participou de missa com crianças em Caxias do Sul. No começo de 2017, quando Michels era diretor do Colégio Murialdo de Porto Alegre e presidente da Associação Protetora da Infância, à qual pertence a escola, a Polícia Federal encontrou no computador dele 330 gigabytes de fotos e vídeos de crianças expondo a genitália ou em cenas de sexo – o volume equivale a cerca de 300 mil arquivos de fotos e vídeos. Depois de localizar os arquivos nos computadores de Michels, a PF rastreou a passagem dele por outras escolas – em Caxias e Araranguá (SC) – e descobriu que desde o começo dos anos 2000 havia relatos de comportamento inadequado por parte do padre: de carícias em alunas, de fazer fotos de meninas de biquíni, dar presentes e levar para passeios. Ano passado, a partir do trabalho da PF, a Polícia Civil investigou possível abuso sexual por parte de Michels, mas o caso acabou arquivado por falta de provas.
– Tínhamos informações de que o padre poderia estar descumprindo a medida judicial. Apuramos como seria a rotina dele, monitoramos missas, fizemos campanas – conta Adriana.
A reportagem, publicada na edição de quarta-feira, teve efeitos imediatos. Na própria quarta-feira, a Rede Murialdo de Educação pediu desculpas à comunidade pelo constrangimento causado diante do envolvimento do padre na investigação sobre pornografia infantil e o Instituto Leonardo Murialdo comunicou a exclusão do religioso do quadro de sócios. Na sexta-feira, a congregação Josefinos de Murialdo decidiu que o padre não poderá mais rezar missas públicas.
– A missão do GDI não é apenas denunciar, trazer à tona tudo aquilo que se tenta esconder da população. É também cobrar das autoridades uma solução. É ajudar, com o jornalismo, a transformar a sociedade – diz Dione Kuhn, editora do GDI.
Lembramos aqui na Redação, assim que o caso começou a ser apurado, que, curiosamente, o GDI da RBS foi inspirado no Spotlight, grupo de investigação do jornal The Boston Globe, que denunciou casos de abuso sexual e pedofilia por membros da arquidiocese católica de Boston. A investigação do jornal norte-americano inspirou o filme Spotlight – Segredos Revelados.
A história se repete – e o papel da imprensa vigilante, também.