Havia uma vez um pequenino planeta na borda do sistema solar. Nem nome ele tinha. Só recebeu um em 1930. Foi chamado de Plutão. Ficou muito feliz. Além de receber o nome do deus da riqueza e dos mortos romanos, foi convidado para fazer parte da elite do nosso sistema solar.
Ele não tinha pequeno príncipe, baobás ou vulcões. Não tinha nada lá. Mesmo assim Plutão tornou-se o nono planeta do nosso sistema. Passou a fazer parte das maquetes, dos mapas, das regras mnemônicas para lembrar dos planetas. Todos os estudantes o conheciam. Por isso ele vivia cheio de orgulho.
Porém, num infausto dia de 2006, foi desclassificado como planeta. Descobriram que um de seus supostos satélites, Caronte, tem uma massa quase tão grande quanto ele. Portanto, ele não o orbita e sim os dois dançam juntos ao redor de um ponto externo no espaço. Por isso, foi retirado da série A dos planetas e foi para a série B, juntando-se a outros planetas anões do cinturão de Kuiper.
Além disso, para arrematar a humilhação, também descobriu-se que existe um outro planeta anão maior do que Plutão chamado Éris. Nem para rei dos anões ele servia.
Foi nesse momento que o planetinha veio me pedir conselhos profissionais.
Por que eu? É o que ele podia pagar. Sabe como é, um planeta pequeno, poucos recursos, sem lobby influente. Só restava buscar um psicanalista obscuro de um pais periférico com moeda desvalorizada.
Seu choro era de luz. Nem gastaria meus lenços de papel. Foram anos de longas videochamadas. Dizia que ele estava quieto no seu canto - quer dizer, na sua raia orbital, afinal espaço não tem canto, nem esconder-se ele podia - e que nunca pediu nada para ninguém. Então, sem ser consultado, o encheram de honrarias, e o convidaram para um clube maravilhoso. Passados uns anos terrestres, nem ao menos um ano plutoniano - que são 248 anos terrestres - o mandaram embora sem aviso prévio. Absolutamente injusto perder o que nem pedira.
Coloquei - talvez o termo certo seja infiltrei - na cabeça e no coração do planeta que ele devia nos perdoar. Nós, humanos, o tratamos como nós somos. Temos vida curta, nossa fama, quando acontece, é transitória e finita. Acrescentei que sofrer por hierarquia é drama de humanos, que ele devia voltar à sua postura cósmica de indiferença planetária. Infelizmente, nós não percebemos que um astro não pode ser tratado com a nossa régua curta.
Falei também que ele estava errado quando dizia que seria melhor que isso nunca tivesse acontecido. É sempre melhor uma boa experiência momentânea, do que nenhuma. Que com isso ele conheceu a insana vaidade humana e agora sabe que ela nada traz de bom. Além disso, que coisa alguma é para sempre, até o Sol, que ele reverencia orbitando, um dia apagará.