Não se sabe quando os cães entraram na história humana. Provavelmente, já andávamos juntos há pelo menos 20 mil anos. É um bocado de tempo para construir nossa bonita amizade. Alguns lobos se separaram do grupo e desenvolverem uma linhagem que evoluiu paralela à nossa. A cooperação na caça era benéfica para ambos. Porém, ao longo dos séculos, passaram a caçar menos e viver para nos cuidar.
Existe um túmulo no Chipre de 9.500 anos que comporta um enterro duplo. Havia um gato e outros objetos junto com o falecido. Isso comprova a tese que os gatos estão conosco ao menos por 10 mil anos. Coincide com a criação da agricultura. Faz sentido, acumular grãos atrai roedores e o melhor remédio para mantê-los afastados são seus predadores. No começo, vieram até nós pelos ratos, toleramos porque eles deixavam os ladrões de cereais longe. Entraram na nossa civilização como guardiães de celeiros. Com o passar do tempo, foram aposentados, vivendo de carinho e ração.
De vizinhos, viraram posse. Durante toda essa longa jornada, amados ou não, quando pertenciam a uma tribo ou a uma casa, eles tinham um dono. Na entrada do século 20, ficou de bom-tom dizer que os animais têm um "tutor". É uma relação diferente, o acento está na responsabilidade ao cuidar e não na posse. As leis que protegem os animais domésticos ficaram severas naquela época. Ninguém ficava impune se os maltratasse. Passou a exigir-se um protocolo sanitário de vacinas para estar com eles. Foi considerado um degrau acima na consolidação da antiga parceria.
Mas o aperfeiçoamento espiritual não parou. No meio do século 21, a palavra tutor deixou de ser usada e os humanos responsáveis passaram a ser chamados de "agradecidos". Ora, é um privilégio servir e cuidar dos cães e gatos. Estabeleceu-se que seria melhor frisar a sorte que os humanos têm por usufruir da sua companhia. Foram criadas as leis que estipularam quem pode, depois de fazer um curso, ter o privilégio de cuidar de um pet.
Mas o aperfeiçoamento espiritual não parou. Na virada do século 21 para o 22, a humanidade se deu conta de que a palavra agradecidos não demonstra toda nossa reverência e afeição. Foi quando os humanos passaram a se chamar de "súditos". A humanidade passou a reconhecer a realeza da presença animal. Criaram-se cursos de etiqueta para reverenciar da maneira correta nossos superiores e penitenciárias para os recalcitrantes.
Mas o aperfeiçoamento espiritual não parou. Na primeira década do século 22, por fim os humanos aceitaram seu papel menor no cosmos e a grandeza que tínhamos diante dos olhos. Nos tornamos os “adoradores" dos deuses cães e deuses gatos. Datam dessa época os primeiros templos de veneração. Nesse momento, finalmente, o ocidente entendeu o valor da vaca sagrada para os indianos.