Esses dias, o Eduardo Bueno reclamou injustamente do soprador de folhas. Classificou-o entre os inventos do medonho por produzir um barulho dos infernos.
O colunista esquece que o aparelho pertence ao universo do cortador de grama. Aquele que o pessoal da praia usa para quebrar o estresse de ficar longe da cidade. Soam o clarim do dever para romper a monotonia do silêncio e despertar-nos da modorra das férias.
Afinal, a praia amolece o espírito. Se não é uma roçadeira zunindo, a preguiça toma conta. Dá vontade de sestear, de ir para a rede. O pessoal até pensa em pegar um livro.
Mas não estou aqui para elogiar as trombetas de jardinagem e seu proselitismo laboral, mesmo aos domingos e feriados. Voltando ao difamado soprador. Na verdade, trata-se de um artefato utilíssimo, além do barulho, protege os homens de seu maior perigo: a vassoura.
Como vocês sabem, a vassoura feminiza o homem. Por isso os sopradores, por isso homem varre com mangueira mesmo durante época de seca. Torra litros de água para evitar ser flagrado com a vassoura na mão.
Sim, existem homens que varrem. São raros, uma casta superior da masculinidade, uma tropa de elite que não teme ser confundida com mulher. Por razões desconhecidas, talvez muito treinamento, eles são imunes ao contato deletério com o vil instrumento que empurra a sujeira e emascula os homens. Se você vir um homem varrendo, esse é macho mesmo.
Empunhar arma qualquer homem faz. Ficar dando tirinho de mentira para provar que é macho é o que as crianças fazem. Agora, pegar na vassoura é que são elas.
Mas, você que quer ser mais macho, como chegar a usar uma vassoura? Como perder o medo? Terapeutas recomendam aproximação por etapas. Use instrumentos menos perigosos no início. Para dessensibilizar, comece com o pano de prato e uma secada de louça. Depois, vá para a pia e tente esponja e detergente. Aos poucos, sem choques, descubra os mistérios da alquimia da espuma.
Domine a angústia e verá que você pode. O membro não encolhe, a voz não afina, a barba não cai, as mãos seguem bem comportadas. É uma experiência e tanto.
Quando passar dessa etapa, enfrente a vassoura. No primeiro dia, só segure. Sinta o peso, o ponto de equilíbrio, a ginga necessária. É quase como uma dança, você a conduz. No segundo dia, arrisque uma ciscada aqui e acolá. Sem exagero. Depois, vá paulatinamente aumentando a área. Por fim, use no pátio, que é notadamente mais difícil. Em algumas semanas, você terá domado a vassoura.
Não existem mais as ameaçadoras vassouras das bruxas. Tudo não passa de um antigo tabu de contágio, superstição, crenças arcaicas sobre medo de perder o pinto. Triunfando sobre a vassoura, você já não precisará mais portar instrumentos que jorrem, soprem ou atirem para afirmar metaforicamente seu gênero.