Em torno de Bob Dylan – sim, você sabe, o único artista da história a ter ganho o Nobel e o Oscar, o Pulitzer e o Grammy –, revolvem-se pencas de histórias insólitas, excêntricas e idiossincráticas, algumas bem divertidas. Vivenciei pessoalmente umas poucas e sei de inúmeras outras. Segundo uma delas, em 1975, ao passar por uma de suas supostas "crises espirituais", Dylan arranjou um encontro com um rabino, tido como sujeito tão idiossincrático, excêntrico e insólito quanto ele mesmo. Um mestre irado, por assim dizer. Sei o nome do dito-cujo, é claro – mas não vem ao caso. O fato é que Dylan chegou ao estúdio do mentor e, sem mais delongas ou etiquetas, o rabugento rabino entregou-lhe uma vassoura e apontou o lugar que deveria ser varrido. Bem versado nos tortuosos caminhos que os místicos mestres costumam palmilhar, Dylan obedientemente se pôs a cumprir a tarefa.
Instantes depois, batem à porta. O rabino ranzinza atende, encara o mirrado mexicano de bigodinho, metido em roupas surradas, e pergunta: "Você é Bob Dylan?".
O recém-chegado se desconcerta um pouco, olha para a sala, sorri meio sem jeito e responde: "Não, eu sou o novo faxineiro. Bob Dylan é aquele ali, com a vassoura".
Não é preciso ter assistido a Kill Bill, de Quentin Tarantino, para ver como se comportam os ditos mestres irados nem para saber que o ato de varrer – seja a sala de meditação, o pátio, o jardim de seixos, o próprio quarto ou a calçada – sempre foi considerado um exercício de paciência, de sabedoria, de humildade e transcendência. Vassoura vem do latim verrere, que significa "agrupar, juntar por meio de varredura". Pois, ao varrer, você primeiro agrupa e depois dispensa.
Só que, faz um tempo, algum ser demoníaco inventou esses sopradores de folhas, ou aspiradores de pó usados na rua – instrumento não por acaso produzido pela mesma empresa que introduziu mundialmente, e em larga escala, a não menos (provavelmente mais) diabólica motosserra. Como se a cacofonia urbana das buzinas, das sirenes, das britadeiras e dos freios que rangem e guincham como se estivessem sendo torturados não fosse o bastante, eis que agora temos serras elétricas, furadeiras, compressores de água para limpar as calçadas e... sopradores de folhas. Assim, ali vem você caminhando, remoendo suas dívidas e repassando suas dúvidas, quando surge uma alma penada soprando aquele treco. Sem falar que há quem o use no domingo de manhã.
Sempre amei vassouras. Agora, estou dividido entre pegar a minha e voar para bem longe – para Pasárgada, quem sabe – ou usá-la como instrumento contundente, tipo taco de beisebol em filme de gângster. Caso opte pela segunda opção, vou atribuir o tresloucado gesto ao desequilíbrio resultante do som emitido por esses malditos sopradores de folhas. Tenho certeza que você irá para a frente da delegacia exigir minha soltura imediata. Mas não grite muito alto, por favor. Tenho ouvidos sensíveis.