Fui testemunha do diálogo. Há alguns anos, um construtor de Minas Gerais que planejava um grande lançamento imobiliário em Porto Alegre ficou surpreso com o alerta de empresários locais de que, se os apartamentos não contemplassem churrasqueiras, suas chances de entrar no mercado local seriam muito baixas. Ele teria entendido mais facilmente se fosse meio-dia de um domingo e pudesse notar o aroma característico da carne na brasa pairando sobre a cidade.
Pois agora a prefeitura acertou em cheio ao carimbar Porto Alegre como a Capital Mundial do Churrasco. A capital dos gaúchos precisava mesmo de uma identidade que a projetasse para além das fronteiras do Estado e do país. O churrasco é ideal porque significa bem mais que equilibrar uma carne sobre a brasa, como já faziam há milhares de anos nossos ancestrais: ele representa a amizade, o compartilhamento, a reunião da família e, por que não?, o momento de deixar de lado as divergências e se concentrar nas melhores coisas da vida.
Porto Alegre, admitamos, não tem grandes atrações naturais, como o Rio, Salvador e Florianópolis. Temos o pôr do sol do Guaíba, ok, mas a selvagem poluição visual demole qualquer esperança de ser reconhecida visualmente, tal qual uma Paris dos pampas, como o são Montevidéu e Buenos Aires. Então, nada mais justo que tomemos para nós um título que é nosso por legitimidade. Porto Alegre, registre-se, conta mais de 100 churrascarias e deve ter quase uma churrasqueira, ainda que improvisada, por domicílio.
Identificar e impulsionar uma marca é decisivo no disputado mercado do turismo mundial. Olhe-se o caso da pequenina Bra, no Piemonte italiano. Trata-se de uma cidade industrial, sem grandes atrativos. Mas ali nasceu nos anos 80 o movimento slow food, que prega o prazer de uma alimentação com calma e ingredientes locais, diferenciados e sustentáveis. É a contramão do fast food. Agora, Bra exibe uma respeitada faculdade internacional de gastronomia e filas para reservas nos seus bons restaurantes. Todos na cidade saem ganhando, mesmo aqueles que nunca provaram a tal “comida lenta”.
Está na hora de colher os legados desta nação do assado e dar as boas-vindas a um naco do turismo gastronômico.
Da mesma forma, os benefícios econômicos que podem advir do reconhecimento como capital do churrasco têm potencial para favorecer gregos e troianos, carnívoros e vegetarianos. Não se precisa – aliás, não se deve – ser um bebedor contumaz para se trabalhar em bar ou na sua cadeia de suprimentos. O mesmo vale para o churrasco.
O selo é só um primeiro passo. Por décadas, o Rio Grande do Sul e Porto Alegre exportaram incontáveis churrasqueiros para o resto do Brasil e para o mundo. Agora, está na hora de colher os legados desta nação do assado e dar as boas-vindas a um naco do turismo gastronômico, que, sozinho, movimenta algo como U$ 50 bilhões anuais. Vale a pena manter acesa a brasa.