Se Lula acertou na escolha de um ministro da Defesa sem detratores ou arestas, nome ideal para iniciar a despolitização da caserna, o presidente eleito torceu a mão na definição do comandante da economia, o cargo mais importante do primeiro escalão.
O equívoco não se assenta apenas nos fatos de Fernando Haddad - um qualificado ex-ministro da Educação, ressalve-se – ser um aprendiz no campo econômico e lembrar mais a escola Dilma de intervencionismo e desastre das contas públicas do que a da responsabilidade fiscal de Pedro Malan e Antônio Palocci. O grande erro de Lula também não foi, como já havia ocorrido com Dilma na Presidência, escolher um nome de sua absoluta confiança para um cargo no qual o professor Haddad parece deslocado e pouco à vontade.
O maior problema é que Lula decidiu fazer política partidária com o cargo que lhe dará, ou não, sustentação na Presidência e que terá voz ativa na encruzilhada entre a catástrofe e a glória ou, no mínimo, um honroso empate técnico ao fim do mandato. Ao nomear Fernando Haddad para a Fazenda, depois de revesti-lo com a tonalidade de sucessor ungido, Lula chamou a eleição de 2026 para dezembro de 2022. A cada aparição de Haddad, estará ali também o candidato à sucessão. Se fizer a economia voar, terá grande chance de se eleger, como ocorreu com FHC. E é por isso que, desde já, Haddad será sistematicamente confrontado nas batalhas políticas no Congresso e dentro ou fora do governo, com consequências imprevisíveis para a economia e para qualquer reforma que se tente implementar.
Como Lula sabe de tudo isso, ele dobrou a aposta e arrisca a própria trajetória baseado em três variáveis. A primeira é o fatiamento do superministério de Paulo Guedes em três pastas, esvaziando um tanto a função de piloto da economia. A segunda é a independência do Banco Central, decisiva para segurar as pontas de possíveis desatinos fiscais, e a terceira é o povoamento dos cargos de segundo e terceiro escalão – os que tocam na prática o dia-a-dia econômico – com nomes que possam inspirar alguma confiança.
Além disso, Haddad chega ao cargo com um consolo. Como não se espera mesmo muito dele na função, qualquer pequeno avanço será saudado. É o contrário de Paulo Guedes, que desembarcou no governo a bordo de um trem de promessas liberais – que incluía R$ 1,25 trilhão em privatizações e o fim do patrimonialismo que trava o Brasil há séculos – e acabou apequenado pelas resistências da máquina estatal e de um Congresso que sequestrou a execução do orçamento. E, ao menos, Haddad tem outra vantagem sobre o antecessor: não se considera o oráculo da economia, insensível a quem lhe contraria. Se Haddad souber ouvir, aprender e tiver muito bom senso, resta-lhe uma vaga esperança.