Não era montagem, não era ilusão. A foto de uma sala de cinema logo depois de uma sessão, possivelmente lotada, de filme para crianças ou adolescentes (ou daria na mesma). Entre as fileiras de poltronas, o tapete bordô parecia um campo florido. Lixo. Lixo. Lixo. Copinhos de papel, saquinhos de pipoca, guardanapos, papel de bala e chocolate, restos de bigmacs ou baurus ou seja o que for: inacreditável. Não alguns, não poucos, mas um tapete infeliz.
Teria sido simplesmente essa espécie de idiotia coletiva que toma conta de alguns grupos, também adultos, quando se alegram, se exaltam?
Ali tinham-se reunido crianças ou porquinhos? Jovens ou selvagens, crianças suinizadas e adolescentes sem educação?
Minha pergunta foi, na hora, feita a mim mesma depois de fechar a boca (tinha ficado boquiaberta): eles trazem de casa esse tipo de comportamento? Talvez fizessem isso por oposição a uma educação demasiado rigorosa em casa? (Isso, nem pensar.) Talvez fosse mesmo costume, ir largando tudo pelo chão, roupas, papel, restos, qualquer coisa, pois a mãe-escrava ou a empregada idem correria atrás para recolher?
Ou teria sido simplesmente essa espécie de idiotia coletiva que toma conta de alguns grupos, também adultos, quando se alegram, se exaltam? Acho que nunca saberei. Mas fiquei intrigada com a primeira questão: seriam assim também em suas casas? Pais com receio de controlar, de exercer alguma ordem e autoridade, pois poderiam traumatizar os filhotes – ou pais que não tinham tempo nem emoção suficientes para dar uma olhada nos comportamentos da meninada... ou ainda, como certa vez me disse o psicólogo de uma escola famosa, “eles em casa não têm pai e mãe, têm um gatão e uma gatinha”?
Não tenho resposta. Talvez professores e psicólogos tenham. Não quero nem devo culpar os pais: educar é difícil, parte desse processo é como amestrar uma foca. Horrível, eu sei, mas treinamento necessário: levantar a tampa do vaso para fazer xixi, por exemplo, não botar o dedo no nariz... A outra parte, que há de ser muito maior e melhor, é o afeto, a alegria, a curtição de ver essas criaturinhas que produzimos ou adotamos se transformando em pessoas. Isto é, em um ser humano com habilidades como portar-se direito, ser gentil, ser limpo, ter limites sem perder os sonhos, ter alguma lucidez sem perder as descobertas – que serão maravilhosas algumas, outras terríveis.
Talvez eu simplesmente esteja enganada: ninguém educa ninguém, apenas somos exemplo. Se a postura, o ambiente, em casa for cordial, gentil, amorosa, positiva, estimulante, não se precisará de mais do que algumas indicações do tipo: não falar com a boca cheia, não estapear o irmão menor, não mexer nas coisas dos outros, não entrar sem bater (essa serve para mãe também), não ser grosseiro com ninguém (nem professores...), mas também não enquadrar, não ensinar a ter sangue de barata. Ser alguém que possa viver neste mundo em razoável harmonia. Sempre um guerreiro pelas boas causas, pelos seus direitos, pela verdade.
Sei que estou esboçando uma paisagem idílica, mas bem que podia ser assim, mais vezes.