Hipótese que anda rondando o debate sobre o futuro político do Rio Grande do Sul: que o MDB ora no poder não tem nada a ver com o MDB da resistência democrática; que este MDB, liderado pelo Sartori – que, conforme algumas pesquisas, anda bem cotado para a reeleição – , é no fundo o velho Partido do Interior, de que tem falado André Singer. Um partido de prefeitos e lideranças cujo horizonte é sempre local, que não vê sentido em apoiar mudanças estruturais que apontem para a superação da dependência tecnológica e desse absurdo ultracentralismo brasileiro. Um partido pragmático, que joga apenas o jogo possível, esforçando-se para pegar uma beira no banquete, com horizonte de quatro anos.
Se é assim, explica-se por um novo lado uma simpatia que ele recebe, difusa mas perceptível, de outra força da psicologia estadual: parece haver um traço forte de ressentimento, muito mais interiorano do que metropolitano, contra alguns aspectos da vida social e mental moderna. Casamento de pessoas do mesmo sexo, ecologia, direito ao aborto, reconhecimento de direitos de afrodescendentes e indígenas, rechaço ao feminicídio e à opressão contras as mulheres, essas causas que a última geração viu ganharem força e voz na praça pública, justamente essas causas parecem ser tidas como coisa diabólica em muitos círculos do Interior.
Não quero generalizar: estou tentando entender a voga notável de reacionarismo e mesmo de autoritarismo que se viu no episódio da greve/locaute dos caminhoneiros (demanda por intervenção militar, por exemplo) e que desponta nos índices e que se expressa na intenção de voto do lamentável Bolsonaro. E que aparece também, em proporção menor mas na mesma pauta, na atitude anticultural e anticientífica da extinção das fundações estaduais por Sartori.
No campo da cultura, algo assim se vê não no Interior, mas na proposta da prefeitura de Porto Alegre que prevê, em última análise, um esvaziamento do Fumproarte, do Funcultura e de outros fundos ligados ao patrimônio histórico, ao esporte e a várias outras áreas. Tempos complicados.