Morreu o mais gremista dos gremistas. Morreu Cacalo, o torcedor alucinado que foi tudo no Grêmio, de estagiário a patrono, passando pelo cadeira de presidente e pelo comando do vestiário em uma das eras mais vitoriosas destes quase 121 anos de história do clube.
Cacalo vivia o Grêmio como poucos viveram. O defendia com a gana de um Dinho, a disposição de um Kannemann e o sarcasmo de um Danrlei. Cacalo nunca foi Valdo, tampouco Gessy. Porque esses jogavam com diplomacia vestidos de Grêmio. Quando se tratava de Grêmio, Cacalo dispensava as diplomacias. A paixão era maior.
Conheci pessoalmente o Cacalo em 1996, quando iniciei minha trajetória no jornalismo esportivo como setorista do Grêmio. Ele era o vice de futebol. A relação com os repórteres era amigável, de boas conversas e muita malícia. Ele costumava deixar todos os repórteres sempre mobilizados com uma frase enigmática:
"Ó, lugar de setorista é no setor". Soltava essa no pátio do Olímpico, soltava um sorrisinho irônico e saía. Às vezes, havia notícia. Quase sempre, não. Ele se divertia de qualquer forma.
No último dia da gestão como presidente, no verão de 1999, fui incumbido de acompanhar Cacalo. Estive na Assembleia Legislativa com ele, numa audiência oficial, andei no ômega azul marinho que conduzia o presidente, o ajudei a limpar as gavetas. Demos boas risadas. Ele de terno azul marinho, sapatos pretos reluzentes, gravata.
Não parecia o Cacalo torcedor de sempre. Ele mesmo se sentia um tanto desconfortável com aquela liturgia cargo.
Aquelas horas juntos renderam uma página 4 e 5 de Zero Hora, na época destinada à principal reportagem do dia. Ele ficou tão emocionado com aquelas duas páginas que as guardou. Não foram poucas as vezes em que me contou isso.
Voltamos a trabalhar juntos entre 2012 e 2014, no Diário Gaúcho. Eu era o editor de esportes, e ele, colunista. Aquela era uma situação curiosa, era o repórter iniciante lá dos anos 1990 editando o dirigente vitorioso.
"Meu chefe!", divertia-se sempre que nos encontrávamos.
Voltamos a estar juntos no Sala de Redação por um curto período. Os programas com ele eram sempre quentes.
Porque Cacalo era movido pela paixão ao Grêmio e nada mexia mais com ele do que defender essas três cores. A malícia em cada colocação, o deboche, a flauta. Cacalo movia um mundo por seu Grêmio. É esse o legado que deixa, de um amor incondicional e de devoção de uma vida inteira. Ele nos deixa neste sábado frio de inverno. Seu exemplo de gremismo seguirá para as futuras gerações.
Descansa, meu amigo. Ah, e lugar de setorista é no setor.