Há 10 dias, Juan Jesus está sem sair de casa, em Roma. Cumpre à risca a ordem de confinamento decretada pelas autoridades diante do quadro assustador que vive a Itália, assolada pela pandemia do coronavírus. Nos primeiros dias da quarentena, ele olhava através da janela de sua casa, no bairro Casal Palocco, e ainda via alguns vizinhos caminhando na rua, correndo ou levando o cachorro para passear. Porém, nas últimas 72 horas, o cenário mudou.
— Estou olhando na sacada há 20 minutos e, se vi três ou quatro pessoas na rua, foi muito. O Brasil precisa estar preparado para enfrentar esse vírus — orienta o zagueiro formado no Inter, que concedeu entrevista à coluna. Confira alguns trechos.
Como está a tua rotina em Roma?
Cara, estou de quarentena mesmo. Fico dentro de casa, mantenho uma rotina de treinos que a Roma passou, a qual tenho de fazer pela manhã, e depois ocupo o tempo. Hoje, por exemplo, furei a parede para colocar um quadro, um espelho, na verdade, brinquei com meu filho (Eduardo, três anos) e li um pouco. Vou arrumando algo para fazer.
Faz quanto tempo que entrou de quarentena?
Faz oito dias. A Roma decidiu na quarta passada (11). Fomos treinar, ate tinha viagem para Sevilha, onde jogaríamos pela Liga Europa, e o clube decidiu que não embarcaríamos e que entraríamos nesse período de quarentena. Orientaram a ficar em casa, não sair nem para ir ao supermercado. Se houvesse necessidade, era para pedirmos para algum familiar ou empregado fazer isso. Estamos confinados, eu, minha mulher e a babá do meu filho.
Como está Roma? Que imagem você tem da sua janela agora?
Como moro em zona residencial, nos primeiros dias ainda via muita concentração de pessoas. Até mandava para amigos que moram em Milão, que virou cidade-fantasma. Aqui, as pessoas ainda corriam nos parques, por exemplo, levando cachorro para passear, caminhando, até o ministro dar o aviso de que haveria multa para quem estivesse na rua. Só se pode sair agora para ir ao supermercado, farmácia ou para alguma emergência. Agora, há muito menos gente na rua. Faz 20 minutos que estou olhando a sacada, e vi três ou quatro pessoas, foi muito.
Você, como está, diante desse cenário na Itália?
Não estou assustado. Não tem ninguém idoso na família, meu filho tem três anos, e as crianças são mais resistentes, sou um atleta, saudável. Por outro lado, estou muito triste pela situação aqui na Itália, com a quantidade de mortes, a dor das pessoas que perdem um parente e nem podem velá-las. Hoje, chegou a 427 mortes (até as 15h, horário da entrevista), ultrapassou o número da China. Assusta o impacto que o vírus esta causando. É um dado muito forte ter tanta mortes em tão pouco tempo. De alguma forma, tentamos ajudar. O clube tem sua fundação, a Roma Cares, que ajuda hospitais. O dinheiro das multas que pagamos no dia a dia, vai para a fundação.
O que fica de lição para o Brasil?
O Brasil tem de se preparar. Aqui na Itália, se dizia: "o vírus está lá na China", "é só um resfriado", "é só uma gripe". Mas chegou aqui e está matando muita gente. Sabemos que a estrutura de hospitais aqui é muito parecida com a que há no Brasil, com problemas. Esperamos demais aqui na Itália. Tem de se preparar, ninguém quer enterrar um parente. Temos de começar a pensar no próximo mesmo sem conhecê-lo, ficar em casa para não virar um portador. Em resumo, precisamos começar a ser mais altruístas, para salvar pessoas.
Me fala como é esse treino que você faz?
O clube mandou. Além disso, tenho um aplicativo que ajuda. Faço 45 minutos de bicicleta, subindo o peso e o nível de forma gradativa. É um trabalho para cansar mesmo. Tenho a sorte de ter um jardim em casa. Antes da quarentena, comprei um trampolim para brincar. isso ajuda também a queimar a energia do Eduardo. Ele tem muita (risos).
O desafio é manter uma rotina estando confinado.
No início, até questionamos do porquê não ser liberado para voltar ao seu país, o que vimos ser complicado demais nessa situação. Na conversa com os companheiros, por WhatsApp, o tom é mesmo: "Não aguento mais, já fiz mil coisas e ainda são 15h", já ouvi. Mas é difícil para todo mundo, Somos jogadores e privilegiados. A Roma segue pagando salários, moramos em bons lugares. Imagina um trabalhador que precisa sair para a rua e buscar o sustento nessa hora? Procuro sempre pegar o lado bom, de contar com uma estrutura boa nesta hora.