Nada em um clube de futebol é mais sagrado do que sua camiseta. Nem mesmo seus ídolos. Esses passam e entram para a história. A camiseta fica e identifica, exibe a relação de amor do torcedor com seu clube. Por isso, o Estudiantes-LP, o rival do Grêmio, na Libertadores, tratou de resumir seu momento na manga direita no uniforme que estreará nesta terça-feira (7). A frase é poética, cheia de drama, como convém a um bom argentino, e fiel à realidade do clube:
— A la gloria no se llega por un camino de rosas.
Quatro vezes campeão da América, tradição pura, o Estudiantes decidiu encarar os espinhos para voltar aos melhores dias. Por isso, colocou, neste ano, o futebol em segundo plano. Não é que abrirá mão de buscar a vitória e pelear até sua última gota de suor. Isso seguirá, faz parte do seu DNA. Só que decidiu finalizar a construção do seu estádio, canalizar para lá todas as suas energias e dinheiro. Nada de contratações de renome, salários fora da curva e arroubos por técnico de renome. Qualquer peso argentino que entrar no cofre será drenado à obra.
Quando se fala em clube pode traduzir-se por Juan Sebastián Verón, 43 anos. Para os hermanos, La Brujita. Ele é o Estudiantes. Como me resumiu o redator de Esportes do jornal Hoy, de La Plata, é o "maior ídolo da história do clube". O colega Martín Cabrera, do concorrente El Día, o define como o "dono do clube".
Verón tem passe livre da torcida. Não é para menos. Em 2006, aos 31 anos, no seu auge, o Real Madrid o assediou para incluí-lo entre seus galácticos. Ele recusou. Saiu campeão italiano da Inter de Milão e atravessou o Atlântico para se aninhar no clube do seu coração. Meses depois, o Estudiantes comemorava o título do Apertura, colocando fim a 24 anos sem conquistas. Três anos depois, veio a Libertadores. A mesma que o pai de Verón, Juan Ramón havia ganho no triênio 1968/69/70. Juan era chamado La Bruja, pela magia com a bola. O filho, logo, virou La Brujita.
Véron, com toda essa história, poderia muito bem pegar sua fortuna e cuidar da vida em seu country nos arredores de La Plata. Mas ele ainda acha que pode fazer mais o. E esse mais é dar uma nova casa. Em 2005, um ano antes de ele voltar, o Estudiantes decidiu derrubar o velho Jorge Hirsch e erguer uma arena para 30 mil pessoas no lugar. O projeto durou um ano. O estádio está encravado na região central, ao lado do Bosque de La Plata, o pulmão verde da cidade, onde ficam o observatório, o museu de ciências naturais e o zoológico. Uma construção desse porte infringia o plano diretor. As licenças vieram. O dinheiro, não, e o endereço virou fantasma de concreto.
O Jorge Hirsch é histórico para a torcida. Tem alma própria. Muito, me conta Martín Cabrera, por aquele 3 a 3 contra o Grêmio em 1983, com sete jogadores — e toda a sorte de intimidações e violência. Por isso, Verón decidiu que era hora de retomar a obra e finalizá-la. O sonho começou em sua primeira gestão, entre 2014-2017, em que chegou a acumular os cargos de presidente e capitão do time. Reeleito, fez da casa nova sua obsessão. Nesta semana, Verón anunciou que assinará crédito de US$ 5 milhões com o Itaú para tocar as obras e deixar o estádio apto a receber jogos. O plano é inaugurá-lo em nove meses. Serão dias espinhosos em campo. Mas, como avisa a manga da nova camisa, "a la glória no se llega por um camino de rosas".