Sandro Dorival de Matos, 45 anos, é um dos seguranças do Inter, figura frequente nos treinos, jogos e nas viagens da delegação. É dos bons. Está sempre de prontidão, centrado, atento a tudo o que acontece ao redor - e ao que pode vir acontecer. No domingo, no entanto, Sandro quebrou seu próprio protocolo. No primeiro gol do Inter, deu um soco no ar e trocou o semblante sisudo por um sorriso de orelha a orelha. Naquele momento, o segurança deu lugar ao pai. Afinal, acabava de ver o primeiro gol de Thales como profissional do clube. A cena foi até registrada no programa Fantástico, no domingo. Nesta segunda-feira, por telefone, Sandro conversou com a coluna. Confira.
Como bate o coração do pai de um zagueiro?
Vou te falar, é uma emoção muito grande, sabe? Tenho outros três filhos, o Douglas, o Lucas e a Laís. Cada um em seu espaço me causa emoção muito grande. Com o Thales, é diferente porque trabalho no Inter com ele. Em certos momentos, consigo separar o segurança do atleta, o pai do filho, Mas quando fez o gol... Imagina, tu estás ali sozinho e vem a emoção de ver todo mundo aplaudindo teu filho. Fiquei tão feliz que cheguei a me emocionar. É muito gratificante.
O Thales fez o senhor chorar no trabalho, é isso?
As lágrimas até consegui segurar. Mas a emoção do gol, extravasei. Dei um soco no ar. Estava ali perto da torcida organizada do Novo Hamburgo e percebi que as pessoas me observavam como quem pergunta: "O que ele está fazendo?" Mas imagina: tu olhas para o campo e pensas assim: "É o meu filho, eu o vi lutar para chegar aonde está." Agora, o Thales não chegou sozinho. A mãe dele, a Marlene, minha ex-mulher, tem muito nessa história, os irmãos dele também. Como trabalho no clube, as pessoas fazem a ligação comigo.
Como é vê-lo conquistar espaço no Inter depois de empréstimos para Bahia, Atlético-GO e CSA?
Tem coisas que o dinheiro não paga. Ele está como criança. Teve momentos difíceis, no Bahia jogou muito, assim como no Atlético-GO. Mas depois se destacou no CSA. Ele aproveitou muito bem a chance.
Falta agora um gol no Beira-Rio.
Olha, eu não sei qual será a minha reação quando ele fizer um gol no Gigante da Beira-Rio, com toda aquela massa, o estádio cheio, todos gritando o nome dele.
Qual o conselho de pai que o senhor dá para ele?
Sempre falo para o Thales que tem de ser zagueiro arroz com feijão. Se tiver de dar balão, que não tenha vergonha. Feio não é chutar para o lado, feio é errar e permitir o gol. Ele se espelha muito no Índio.
O senhor sofre muito nos jogos?
Bah, vou te dizer. Lá em Novo Hamburgo, cheguei a dar de cabeça (para tentar afastar o lance) quando chutou a bola e ela voltou. Dá um nervoso. Hoje, o Thales está bem, evoluindo. Mas sei que pode fazer mil coisas boas e uma ruim e, por causa dessa ruim, vão sentar o pau nele. Só que estarei sempre ao lado, nas boas e nas ruins.
Como é no dia a dia de treinos?
É uma emoção diferente, como pai, como segurança, como amigo. Nos treinos, brinca por causa do meu corte de cabelo a zero: "O, careca, quer água?" Ou vem como filho e diz: "Ô, pai, quer água? Está muito quente." Quando vai para o jogo, a gente se abraça forte, e digo: "Boa sorte, meu filho. Deus te abençoe". Sou feliz por trabalhar em um clube e com o meu filho ao lado.
O senhor falou das dificuldades para se tornar um jogador profissional. Isso só o gratifica mais, não?
Eu fico até encabulado de falar sobre o Thales. Sou muito humilde, sou trabalhador, quero o melhor para os meus filhos. Também me emociono muito quando falo deles. A nossa vida foi muito difícil. teve época em que o Thales vinha do treino a pé porque não tínhamos o dinheiro para a passagem. Ás vezes, faltava o pão para que pudesse ir treinar. É uma longa história essa caminhada dele. Mas sempre cito para ele o exemplo do Ronaldinho. Ele tem muito dinheiro, mas nunca se esqueceu de onde veio. Eu digo para o Thales: "Tu podes ser o melhor zagueiro do planeta terra, mas não se te esquece de onde veio, de uma família humilde que te deu amor." O dia que um homem se esquecer da família, ele não é nada.
A alegria do gol é igual à da volta dele ao Inter, no final de 2017?
Fiquei muito feliz, mas também com um pé atrás. Estava bem em Alagoas, ia ser campeão pelo CSA,. Mas como ele disse, um chamado do Inter não se recusa. Nessa hora, você tem de diferenciar o pai do torcedor. O Thales evoluiu muito nessas saídas, tem a família dele, a mulher, Pâmela, e a filhinha, a Valentina, minha neta, dois anos. coisa mais linda do mundo. A cabeça dele melhorou muito. Voltou outra pessoa. Olho para ele e vejo muita determinação, sangue no olho. Com humildade, trabalho e perseverança, o Thales vai chegar lá.