Quem visita o Hospital Colônia Itapuã, em Viamão, sente o peso do ambiente que isolou compulsoriamente os leprosos. Inaugurado em 11 de maio de 1940, recebia pacientes de todo o Estado. No período antes da descoberta da cura, os doentes sofriam pelos sintomas da doença e pelo preconceito na sociedade. A lepra, nome antigo da hanseníase, é uma doença contagiosa, causada pelo bacilo Mycobacterium leprae, afetando nervos e pele.
Impactada após conhecer o local em 2017, a jornalista Ana Carolina de Oliveira escreveu o livro Nós não caminhamos sós: histórias de isolamento no antigo Leprosário Itapuã (Editora Sulina). O trabalho de dois anos envolveu entrevistas e pesquisa para reconstruir o passado da instituição de saúde. O título reproduz a frase escrita no pórtico do hospital: "nós não caminhamos sós".
Entre 1940 e 1985, 2.474 pacientes foram isolados em Itapuã, a mais de 50 quilômetros do centro de Porto Alegre. O Leprosário Itapuã foi construído pelo governo na antiga fazenda Lagoa Negra. Na inauguração feita pelo interventor federal no Estado, Oswaldo Cordeiro de Farias, convidados conheceram as acomodações construídas para abrigar até 500 doentes. Circularam pelos pavilhões da administração, 14 casas inspiradas no leprosário de Carville (Estados Unidos), outras 14 casas duplas, prédio do hospital, farmácia, refeitório, consultórios e enfermaria. A igreja, o necrotério e o cemitério, por exemplo, só foram entregues um ano depois.
Poucos dias após a cerimônia, o Leprosário recebeu os primeiros 91 doentes, transferidos do Hospital de Emergência, no bairro Partenon, em Porto Alegre. Ana Carolina conta que existia "um regimento muito rígido, que era cobrado à risca pelas Irmãs Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã". Oito religiosas se mudaram com os primeiros pacientes. O capelão era Frei Pacífico, capuchinho que hoje dá nome à estrada de acesso ao local. As missas diárias faziam parte da rotina dos internos.
O complexo era dividido em três áreas. Na área limpa, moravam freiras, capelão, médicos e outros funcionários. Na intermediária, estava a administração. Os doentes ficavam na área suja.
A luta contra a doença teve avanço na década de 1940. Em 1949, chegou ao Rio Grande do Sul o medicamento Dapsona, desenvolvido nos Estados Unidos. Não era ainda a cura, mas a medicação mantinha estagnada a doença. Como conseguia negativar os resultados da baciloscopia, permitiu a saída dos primeiros pacientes de Itapuã.
Em 1969, chegou a primeira televisão, na véspera do homem pisar na Lua, em 20 de julho. O rádio era, antes, a fonte de informações do mundo externo. Nas visitas, familiares não chegavam perto dos pacientes. A comunicação ocorria à distância. O antigo leprosário chegou a ter mais de 800 internos.
O esvaziamento de pacientes de hanseníase, desde a década de 1970, permitiu a chegada de pacientes psiquiátricos. Em novembro de 2023, o Hospital Colônia Itapuã, nome atual, tem apenas cinco ex-hansenianos. Todos os pacientes psiquiátricos já deixaram a instituição.
A hanseníase tem cura. O tratamento é oferecido pelo SUS. De acordo com o Ministério da Saúde, a cura é mais fácil e rápida quanto mais precoce for o diagnóstico.
Lançamento do livro
- Nós não caminhamos sós: histórias de isolamento no antigo Leprosário Itapuã (Editora Sulina), de Ana Carolina de Oliveira.
- Sessão de autógrafos na terça-feira (14/11), às 19h, na Feira do Livro de Porto Alegre.
- Sessão de autógrafos e bate-papo com a autora, a escritora Jane Tutikian e Magda Chagas, coordenadora do Morhan MetroPoa, no dia 24 de novembro de 2023, às 19h, na Livraria Taverna (Rua dos Andradas, 736, térreo da Casa de Cultura Mario Quintana).