Um desavisado que passasse os olhos por posicionamentos do futuro Procurador-Geral da República diria, sem titubear, que Bolsonaro escolheu alguém com valores compartilhados por sua base de apoiadores. Foi Paulo Gonet quem votou, por exemplo, contra a responsabilização do Estado pela morte de pessoas que lutaram contra a ditadura militar, como a estilista Zuzu Angel e os guerrilheiros Carlos Lamarca e Marighella. Isso na Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos do Ministério da Justiça, nos anos 90.
Com esse contexto, não seria surpresa uma salva de palmas vindas de apoiadores do ex-presidente.
Mas, como é sabido, a política reserva surpresas com alguma frequência. É preciso, então, esclarecer: a indicação foi feita por Luís Inácio Lula da Silva (PT), em seu terceiro mandato. Na segunda-feira (27), o petista confirmou seus indicados para o STF (Flávio Dino, na vaga de Rosa Weber) e para a PGR (Gonet, para suceder Augusto Aras).
A indicação de Gonet por pouco não foi chancelada pelo próprio Bolsonaro em seu governo, quando da escolha de um novo Procurador-Geral da República. Na ocasião, Gonet era observado como um dos favoritos ao posto. À época, a deputada bolsonarista Bia Kicis disse: "Paulo Gonet é conservador raiz, cristão, sua atuação no STF nos processos da Lava-Jato foi impecável". Contudo, Bolsonaro acabaria optando por Augusto Aras.
Ainda sobre o conservadorismo sublinhado por Kicis, também vale lembrar do posicionamento enfático do futuro procurador-geral em defesa da vida e contra o aborto. Católico praticante, Gonet é um crítico ferrenho ao direito de interrupção da gravidez. Em 2009, publicou artigo entitulado "Proteção à vida: a questão do aborto".
A despeito disso, Gonet foi o escolhido de Lula para a PGR. E, não à toa, a escolha foi aplaudida por bolsonaristas. Entre eles, a própria Kicis.
"Ele é católico, conservador, pró-família e pró-vida. Não é um progressista", destacou a deputada em entrevista à rede CNN.
E por que, então, Lula fez tal escolha? Uma razão importante está entre elas. Dois padrinhos políticos chancelaram a indicação. Alexandre de Moares e Gilmar Mendes, ministros do STF. Pesou a opinião de ambos de que haveria bom trânsito do novo PGR junto ao STF. Na esteira dos recentes embates entre Congresso e a Corte máxima do país, Lula entendeu melhor o caminho da boa vizinhança. A conferir.