O último mês do ano foi particularmente difícil por aqui. Foram duas idas ao hospital em menos de duas semanas, e em cada uma delas precisei me afastar do trabalho. Lembro de um colega que me viu, quando retornei, e perguntou se a vida estava fácil e como ele poderia fazer para conseguir esses dias em casa. Ele não sabia, não o culpo. Preferi não contar.
No primeiro episódio, um quadro viral simples, desses que mãe de criança conhece bem. O filho pega o bicho na escola, passa para a mãe e lá se vão sete dias de peste. Como resisti a ficar de repouso no início, o quadro se agravou e evoluiu para uma infecção bacteriana. Tive febre, perdi a voz e ganhei uma tosse ininterrupta. Sete dias de antibiótico (mais repouso). Tudo sob controle.
Não havia mais batimentos. A gestação não evoluiu. Era uma menina, descobri depois
Mas a razão desse texto para ZH é a segunda parada no departamento médico. Essa que mencionei acima, que o colega não fazia ideia. Era uma segunda-feira e levantei, como de costume, por volta das 6h. Peguei meu filho no colo, o amamentei e fomos para a sala. Já havia sol. Enquanto ele brincava, fui ao banheiro para fazer xixi.
Aqui, um parêntese. Fazer xixi, para uma mulher grávida que já experimentou uma perda gestacional, é uma angústia terrível. Isso porque, a cada vez, sua mente vai lhe lembrar que pode haver sangue junto. E, se houver, é possível que você tenha perdido seu bebê. Eu havia perdido o meu. Havia sangue. Mas eu ainda não sabia.
Soube quando fiz a ecografia naquela manhã. Não havia mais batimentos. A gestação não evoluiu. Era uma menina, descobri depois.
Decidi não falar sobre. Primeiro, porque não tinha forças. Segundo, porque não queria que as pessoas tivessem pena de mim. Nem que me olhassem como vítima. São tantas as mulheres que passam por essa dor – recentemente, a apresentadora Sabrina Sato e a influenciadora Maíra Cardi. Foi ao ler a notícia sobre a perda do bebê de Maíra que mudei de ideia sobre contar.
Lembrei que pessoas com alguma visibilidade, que passam por histórias como a minha, podem ajudar outras a se sentirem menos sós. Meu amigo David Coimbra, ao escrever sobre o câncer, inspirou muitos. É como se o universo nos dissesse: a vida não é feita só de foto de praia do Instagram. São dissabores, dores, doenças. Ninguém está livre.
Por isso, cara leitora, caro leitor, se você também tem uma história dessas — e que não contou a ninguém — aqui vai um abraço. Que você encontre conforto e carinho nos seus. Não se culpe. Mesmo a noite mais escura termina com o nascer do sol.