Sim, toda generalização é burra. Não são todos os brasileiros, eu sei, mas há sim uma parcela generosa deles que ama odiar. Que sente prazer em linchar o outro, verbalmente, virtualmente, ou — ainda mais difícil de compreender — fisicamente. Uma parcela que ostenta um taco de beisebol como um troféu. E que reúne forças físicas para descarregar o ódio em cima de alguém (que ele julga ser) menos merecedor de respeito do que ele.
Qual a razão de tamanho ódio? Difícil apontar assim, de pronto.
Alguns dirão que o mundo se tornou violento demais nas últimas décadas. Mas como, então, explicar as arenas do Coliseu lotadas a partir de lutas mortais entre animais e gladiadores? Batíamos palmas enquanto alguém sangrava. E o que dizer do ano em que milhares foram às ruas debochar e pedir que um homem que pregava o amor fosse crucificado em praça pública? Amor ao próximo? Francamente. Crucifica-o!
Equivocado também seria dizer que é um sentimento exclusivo tupiniquim. Foi na terra da liberdade que um policial pressionou, recentemente, o joelho sobre o pescoço de alguém que suplicava: "eu não consigo respirar". O ódio cega e, neste caso, também não permitiu ouvir.
Falo de ódio com o intuito de tentar minimamente entender o que leva três a quatro pessoas descarregarem chutes, socos, e um pedaço de pau sobre o jovem congolês que somente buscava reivindicar a remuneração à qual teria direito, em troca de seu trabalho em um quiosque que leva o nome de Tropicália. Que tipo de coisa passa na cabeça de um ser capaz de fazê-lo se sentir autorizado a espancar alguém até a morte em plena luz do dia, à beira do mar do Rio de Janeiro?
Normalizamos a lógica da barbárie a ponto de o corpo ter permanecido estirado no chão enquanto o quiosque funcionava tranquilamente. Haverá justiça para Moïse, o congolês brutalmente assassinado na Barra da Tijuca?
Num mundo utópico, os responsáveis seriam exemplarmente punidos e a família de Moïse seria minimamente reparada pelo poder público, diante de uma dor dilacerante, narrada pelo tio nesta quarta-feira (2) à Rádio Gaúcha.
No Brasil de 2022, os verdadeiros responsáveis provavelmente não pagarão pelo que fizeram, morrerão muitos mais inocentes vítimas de violência (e quando muito haverá identificação dos autores) e haverá quem diga que imigrantes não merecem respeito, afinal "vocês deveriam estar preocupados é com os brasileiros" (sic).