Quem acompanha política no Brasil não dorme, tantas são as novidades geradas a cada dia pelos agentes públicos em busca de poder. Na última terça-feira, não bastasse a novela que envolve a sabatina de André Mendonça para o STF (finalmente marcada por David Alcolumbre), uma proposta aprovada pela CCJ da Câmara acendeu um alerta entre opositores do presidente Jair Bolsonaro.
Trata-se do texto que modificaria (de novo) a idade de aposentadoria dos ministros da Suprema Corte. Até alguns anos atrás, os magistrados se aposentavam compulsoriamente com 70 anos. Em 2015, a regra mudou. A chamada "PEC da Bengala" aumentou essa faixa, permitindo que ministros permaneçam no STF até os 75 anos. Depois disso, aí sim, aposentadoria.
Foi por essa regra, por exemplo, que Marco Aurélio Mello precisou deixar a corte em julho deste ano.
Ocorre que a CCJ da Câmara aprovou nesta semana uma nova mudança neste entendimento. Pelo texto, haveria um retorno à legislação anterior. Os integrantes da corte voltariam a se aposentar com 70 anos. Cabe lembrar: a CCJ é presidida pela deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF), que é também autora do projeto.
Opositores identificaram digitais do governo Bolsonaro, já que dois ministros precisariam deixar a corte (por terem mais de 70 anos): Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Não à toa, dois ministros que já tomaram posições duras em relação ao governo federal.
No caso de Rosa Weber, basta lembrar que foi dela a decisão que recentemente suspendeu o pagamento das emendas de relator, instrumento utilizado por Bolsonaro e Lira para distribuir verba em troca de votos no Congresso, sem qualquer transparência.
Além disso, é importante registrar que no caso de aposentadoria — ou saída de qualquer que seja o magistrado — a prerrogativa de indicar novos integrantes para o STF é do presidente da República. Neste sentido, Bolsonaro poderia ampliar sua "influência" sobre o STF e passaria de dois (Kássio Nunes e André Mendonça) para quatro o número de indicações para o Supremo em sua gestão.
Nos bastidores, juristas e ministros do STF são categóricos ao afirmar que a regra não agiria retroativamente, ou seja, não significaria aposentadoria para Lewandowski e Rosa Weber, que permaneceriam até os 75 anos. Ainda assim, aliados do governo decidiram pagar pra ver.
É cedo para dizer se o projeto terá sequência no Senado, mas em tempos de embates públicos entre Judiciário, Executivo e Congresso, há mais um elemento no horizonte para implodir a relação.