Ele é homem de confiança do presidente da República. Foi comandante Exército brasileiro durante os governos Dilma e Temer. Com a saúde debilitada por conta de uma doença neuromotora degenerativa, deixou o posto em 2019, sendo sucedido pelo general Edson Pujol. Antes de deixar o cargo, porém, não escondeu apoio ao então candidato Jair Messias Bolsonaro.
A aproximação foi tanta que ele receberia os créditos por parte do presidente eleito, um dia depois de sua posse, em Brasília.
— O senhor é um dos responsáveis por eu estar aqui — agradeceu Bolsonaro ao general Eduardo Villas Bôas.
Natural de Cruz Alta, Villas Bôas ingressou no Exército em março de 1967. Ascendeu na carreira militar e ganhou respeito moral entre os colegas a ponto de o ex-presidente Temer tê-lo mantido no comando do órgão mesmo após ciência de que seu estado de saúde se agravaria aos poucos. Foi com ele que Temer discutiu a recriação do Gabinete de Segurança Institucional, com a nomeação do também gaúcho Sérgio Etchegoyen como ministro. Em pouco tempo, Etchegoyen se tornaria um dos homens fortes do governo.
Villas Bôas e Etchegoyen mantêm relação de amizade "desde guri", como descreveu o próprio. Os fatos foram revelados no livro "General Villas Bôas: conversa com o comandante", recém-lançado pela Editora FGV. A publicação também trouxe lenha para a fogueira política, por conta da revelação de bastidores de uma manifestação feita pelo então comandante do Exército no Twitter, em 2018.
Voltemos no tempo: na ocasião, abril de 2018, estava prestes a ser julgado no STF um habeas corpus apresentado pela defesa do ex-presidente Lula. O objetivo era fazer com que Lula pudesse continuar respondendo ao processo do triplex em liberdade, em que pese condenação após segunda instância.
Na véspera do julgamento no STF, Villas Bôas escreveu: "Asseguro à Nação que o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais".
A mensagem teve repercussão imediata. Publicada por volta de oito horas da noite, foi parar até mesmo no Jornal Nacional, da TV Globo. O motivo: o texto fora interpretado como pressão indevida do alto comando do Exército sobre o STF. O fim da história já é conhecido: o habeas corpus fora rejeitado e Lula preso.
O que há de novo agora, feveiro de 2021, é a revelação de Villas Bôas de que o conteúdo daquela mensagem foi discutido com a alta cúpula do Exército. Portanto, uma manifestação muito bem planejada. Villas Bôas negou nas entrevistas a Celso Castro — que originam o livro — que se tratava de uma ameaça; reduziu a interpretação a "um alerta".
Conforme a Folha revelou inicialmente, ao menos três ministros do governo Bolsonaro (hoje) e o atual chefe da Força souberam da nota — na ocasião, 2018 — que teria um conteúdo ainda mais pesado.
A divulgação dos fatos gerou reação de ministros do STF e foi duramente criticado por um magistradoo que poucas vezes se manifesta fora dos autos: Edson Fachin, relator do pedido da defesa de Lula. Em nota, Fachin afirmou que, "diante de afirmações publicadas e atribuídas à autoridade militar", pressão sobre Poder Judiciário é "intolerável" e "inaceitável".
O episódio não parou por aí. Isso porque o próprio general Villas Bôas voltou às redes sociais nesta terça-feira (16) e ironizou a mensagem do ministro do STF. Também no Twitter, replicou: "três anos depois", em alusão à demora da manifestação do magistrado.
Irritado, o ministro Gilmar Mendes saiu em defesa do colega de suprema corte, ainda que sem citar nomes. "A harmonia institucional e o respeito à separação dos poderes são valores fundamentais da nossa república. Ao deboche daqueles que deveriam dar o exemplo responda-se com firmeza e senso histórico: Ditadura nunca mais!".