Houve um homem que previu o golpe muito antes de a gente discutir se, afinal, foi ou não foi. E, diante desta perspectiva, organizou um movimento junto à população alicerçado, vejam só, na força das ruas.
A mesma força essa que o ex-presidente Michel Temer disse na terça-feira, à Rádio Gaúcha, que impôs o processo de afastamento de Dilma Rousseff — e não uma conspiração formada por ele e por ministros que viram ali a oportunidade de chegar ao comando da República.
Pois este homem está retratado no filme que recupera um importante período da história. Um grito nascido da efervescência popular, guiada por uma cadeia nacional de rádio: o Movimento da Legalidade.
Decidi escrever sobre o filme de Zeca Brito porque queria que todos experimentassem a mesma situação que eu senti, naquela sala de cinema do Guion, na tarde do último sábado. Uma fila de senhoras e senhores emocionados à espera de ver, na grande tela, o retrato de algo que vivenciamos bem aqui no Rio Grande do Sul. Viveram eles, digo.
Eu não era nascida quando Leonel de Moura Brizola, então governador do Estado do Rio Grande do Sul, bradou que não permitiria que um golpe fosse desferido por telefone. Brizola, à época, liderou um movimento para que o então vice-presidente da República, João Goulart, retornasse ao Brasil para assumir a Presidência — conforme a Constituição previa — diante da renúncia de Jânio Quadros. Os militares, contam o filme e a história, se organizavam para que Jango não o fizesse.
Curioso é que Temer, um constitucionalista, aliás, evocou este mesmo princípio para justificar para mim e para o David Coimbra, durante entrevista concedida ao programa Timeline, que, a despeito do furor provocado pela participação dele no Roda Viva (e os vídeos que circularam pelas redes sociais), o impeachment de Dilma Rousseff não foi, digamos, golpe. E assim também entendeu meu colega David que escreve sobre a nossa entrevista hoje aqui em GaúchaZH.
Sim, é curioso observar que Temer justificou seu governo como perfeitamente legal — embora ilegítimo para os que lhe fizeram oposição — justamente sob a mesma ótica à qual Brizola se apegou para garantir a posse de Jango: estava tudo previsto na Constituição.
Que Brizola não me ouça. Mas achei curioso.
Enfim, o que eu queria mesmo deixar registrado é a minha sugestão para que você vá ao cinema. Prestigie a arte nacional. A produção do diretor gaúcho Zeca Brito. Assista ao filme. Chame os amigos. Volte no tempo. Reviva a história. Em tempos de fissura por trevas, precisamos iluminá-la. E há luz na legalidade.