A polêmica da vez dos Jogos Olímpicos de Paris não é um resultado esportivo duvidoso, uma penalidade mal marcada ou uma expulsão por mau comportamento. É um trecho da cerimônia de abertura que destacou drags, trans e pessoas com deficiência diante de um banquete alegre e multicolorido.
Imediatamente, a cena foi interpretada como uma releitura desrespeitosa e até acintosa da Santa Ceia - "como assim, gays & companhia em uma das passagens mais emblemáticas da Bíblia"?
A Conferência dos Bispos da Igreja Católica Francesa definiu o caso como "zombaria ao Cristianismo" e "escárnio" diante dos valores cristãos.
Só que não era nada disso.
Thomas Jolly, diretor artístico do espetáculo, falou sobre a controvérsia. Disse que a referência utilizada jamais foi a Santa Ceia: foram os deuses do Olimpo. Tratava-se de uma festa pagã. Não houve intenção alguma de "zombar do Cristianismo", garantiu ele.
— Acho que ficou bem claro... tem Dionísio, que chega nessa mesa. Ele está lá, porque é deus da festa, do vinho (...) A ideia era antes ter um grande festival pagão ligado aos deuses do Olimpo... Olimpo, Olimpíadas — disse Jolly, em coletiva de imprensa.
Ah, mas parecia mesmo a "Última Ceia", representada na bela pintura de Leonardo Da Vinci (aliás, ateu e homossexual)? Sim, parecia. E parecia, também, "A Festa dos Deuses", do holandês Jan Van Bijlert (exposta na França, no Museu Magnin). A obra retrata o Olimpo, com destaque a Apolo e outras divindades, entre elas Dionísio (veja acima).
É curioso como a arte pode despertar tantas interpretações diferentes quantas forem as pessoas dispostas a vê-la. Isso é ainda mais presente quando se trata de algo que rompe paradigmas, como foi o caso da cerimônia apresentada em Paris, que levou ao limite o lema "liberdade, igualdade e fraternidade".
Muitas vezes, a ofensa está nos olhos de quem vê.