Amarrei o lenço vermelho no pescoço, vesti minha boina e, de calça, camiseta e tênis, me toquei de bicicleta até o Acampamento Farroupilha em Porto Alegre - sim, sou uma “gaúcha de apartamento”. Amarrei a bike por lá e me pus a caminhar pelo Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, como faço todos os anos, por profissão e prazer, espichando os olhos curiosos para dentro dos galpões.
Gosto de ver a gauchada pilchada, “vestida de orgulho”, cevando o mate de manhã, acendendo o fogo e separando o costelão na gamela. Me agrada ver a criançada correndo em volta, nas ruas onde não passam carros, longe das telas do telefone celular. Adoro sentir o cheiro da fumaça levantando das churrasqueiras. Me faz lembrar do Interior.
No último final de semana, caminhei meio a esmo pela pequena cidade que todos os anos é erguida no local, até avistar aquela casinha de madeira com flores multicoloridas na janela e uma bandeira do Rio Grande tremulando no mastro. Parei para ver e, que surpresa! Era o Piquete Lendas do Sul.
Há cerca de 15 anos, quando eu cobria o acampamento como repórter, fui recebida pelo casal de patrões do piquete como se fosse da família. Maria da Graça e Gilberto Spíndola me fizeram entrar e ficar. Prepararam rabada de boi no almoço e bolinhos de chuva no café da tarde. Nunca esqueci daquele dia, mas, por essas peças que o destino nos prega, não nos reencontramos mais.
Na esperança de revê-los, pedi licença e estiquei o pescoço para o salão. Lá estavam os dois, como há 15 anos, sorrindo um sorriso aberto e abrindo os braços na minha direção. Eles também não tinham me esquecido. Fiquei para o café, depois para o chimarrão, na companhia de novos amigos que foram chegando, e, enfim, para o churrasco. Não dava para arredar o pé. Na mesa dos Spíndola, sempre tem lugar para mais um.
É de gente como eles - “fina, elegante e sincera”, como diria o poeta Lulu Santos - que quero lembrar neste 20 de setembro, Dia do Gaúcho.
Graça e Gilberto gostam tanto da Semana Farroupilha que ergueram uma réplica do piquete no pátio de casa, no bairro Camaquã. Vivem a data o ano todo, sempre prontos para bem receber, com a cuia em mãos, a chaleira quente e um bom dedo de prosa.