Uma frente pela igualdade de gênero no Judiciário, que pode mudar a lógica de poder nos tribunais e ampliar as decisões judiciais sob a ótica feminina, está ganhando força no Rio Grande do Sul e avançando no país - não sem resistências. Encampada pela ministra Rosa Weber, a pauta agita a magistratura, inclusive no Tribunal de Justiça do Estado (TJ), porque mexe com critérios de ascensão na carreira.
Prestes a se aposentar, Rosa vem preparando terreno para o que se poderia chamar de “gran finale”. Conhecida pela discrição, ela tem pautando, sem alarde, uma série de temas espinhosos às vésperas de sua saída - entre eles, a descriminalização do aborto, em que proferiu um voto corajoso na última sexta-feira (19).
Foi ela, também, quem pautou a discussão, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), sobre o ato normativo que está causando rebuliço entre juízes. A medida propõe uma política de alternância de gênero para o preenchimento de vagas de segunda instância, isto é, para que um(a) juiz(a) vire desembargador(a).
O debate começou na última semana com os três primeiros votos favoráveis à mudança (entre 15 conselheiros) e deve ser retomado nesta terça-feira (26), sob forte pressão.
O Conselho de Presidentes dos Tribunais de Justiça do Brasil (Consepre) já emitiu nota pedindo a retirada da proposta da pauta, com a chancela de todos os membros, inclusive da desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, do RS.
O argumento é de que a alteração “não compete ao CNJ”. A nota diz que “é amplamente noticiada, registrada e estudada a disparidade de tratamento entre gêneros na estrutura social e, consequentemente, na composição do Poder Judiciário. Porém, a correção desse problema social deve observar o princípio da legalidade”.
Quem defende a mudança lembra, entre outras coisas, que, pela Constituição Federal, “todos são iguais perante a lei, sem distinção”. A discussão é pertinente e complexa.
Ao conversar com a juíza gaúcha Josiane Caleffi Estivalet, que atua no TJ, integra o movimento nacional pela paridade e inclusive já publicou um artigo sobre isso, eu soube que, em pleno 2023, ainda há três Estados com Cortes sem nenhuma desembargadora sequer - em Rondônia, Amapá e Mato Grosso do Sul.
Não é o caso do Rio Grande do Sul, felizmente, mas, isso, por si só, já merece uma profunda reflexão. Se elas representam mais de 50% da população brasileira, é justo que dividam os espaços com os homens, inclusive no comando dos tribunais.
— A gente tem de começar a problematizar isso. Não podemos mais olhar com naturalidade uma Corte composta apenas ou majoritariamente por homens. Como diz a ministra Rosa Weber, não pode haver assuntos tabu — resume a juíza Josiane.