Foram 53 anos de trabalho, em um ofício que exige discrição, invisibilidade e disciplina. Aristides Germani Filho serviu 12 governadores de diferentes partidos, organizou centenas de solenidades públicas e ajudou a recepcionar os mais ilustres e eminentes convidados.
Agora, aos 81 anos de vida, o chefe do Cerimonial do Palácio Piratini, na Capital, decidiu que era a hora de flanar em outros salões. No fim da tarde de segunda-feira (2), emocionado e feliz, ele se despediu do governador Eduardo Leite e do lugar que aprendeu a amar e a respeitar como se fosse o próprio lar.
Educado à moda antiga, discreto no falar e no andar, impecável na aparência, o servidor iniciou a carreira no governo de Peracchi Barcellos, em 1969. Desenvolveu a curiosa habilidade de se mimetizar ao ambiente e, assim, testemunhou alguns dos mais marcantes episódios da história política contemporânea do Rio Grande do Sul.
Em maio de 2014, depois de muito insistir, consegui convencê-lo a conceder uma longa entrevista a Zero Hora (leia aqui). Foram duas tardes de conversa, entre os murais de Aldo Locatelli, no belíssimo salão Alberto Pasqualini. Nunca esqueci.
— Nós, cerimonialistas, temos de ser cegos, surdos e mudos — resumiu ele.
Dali em diante, passei a admirar aquele homem delicado e gentil e a acompanhá-lo nas cerimônias oficiais no Palácio, que cobri como repórter. Aristides nunca se envolveu com política, sempre soube respeitar as diferenças e coleciona elogios por onde passou - ao longo dos anos, ele também cuidou do cerimonial de órgãos como o Ministério da Justiça, a Assembleia Legislativa e a Câmara de Porto Alegre. Agora, diz que quer cuidar de si.
— Fiz 81 anos em 15 de dezembro e pensei muito. Tenho paixão pelo que faço, mas chegou o momento de parar. Decidi que encerraria esse ciclo com uma última missão: a transmissão de cargo ao governador Eduardo Leite, uma pessoa muito especial. Foi lindo — conta.
Ao comunicar ao chefe que estava de saída, Aristides ouviu um sincero e comovido agradecimento de Leite, em nome de todos os que o antecederam. Recebeu o carinho da equipe e desceu a escadaria de peito estufado, com o traje alinhado e, é claro, nenhum fio de cabelo fora do lugar, levando consigo segredos que ninguém jamais saberá.
Sucessão
Ao longo da carreira, Aristides ajudou a formar muita gente, em uma área que requer uma série de habilidades - desde conhecimento de etiqueta e de protocolos até características pessoais singulares. Um dos discípulos preparados por Aristides é Daniel Alano, atual subchefe do Cerimonial do Palácio Piratini - que inclusive já apareceu na coluna, em sua outra faceta, a de cuteleiro.
— Eu disse ao governador que o Alano estaria disponível. Sempre foi muito dedicado, bastante responsável e, além de ter sido um fiel escudeiro, gosta do que faz, o que é essencial — ressalta Aristides.
A decisão deve sair nos próximos dias.