Pesquisadora reconhecida no mundo acadêmico, intelectual respeitada e bem-sucedida no país e no exterior, a antropóloga Ruth Cardoso nunca gostou do título que recebeu quando seu marido, Fernando Henrique, tornou-se presidente da República. Ainda que detestasse o rótulo pomposo e fora de moda a ela imputado entre 1995 e 2003, Ruth foi a mais importante primeira-dama do Brasil contemporâneo.
Começo o texto assim, porque tenho acompanhado com alguma surpresa a mais nova polêmica dos “últimos cinco minutos” no país das controvérsias: qual deve ser, afinal, o papel da primeira-dama da nação. A querela veio à tona depois que a socióloga Rosângela (Janja) da Silva deixou claro que não será mera peça decorativa no governo Lula.
Em entrevista ao programa Fantástico, da TV Globo, veiculada no último domingo (13), Janja disse que planeja “ressignificar” a função e atuar na articulação do governo com a sociedade. Não citou Ruth, mas é importante lembrar: a cientista social falecida em 2008 abriu caminho. Com classe e elegância, mostrou que uma primeira-dama pode, sim, atuar em distintas frentes, de variadas formas.
Ruth trabalhou e dialogou com empresários, ativistas, políticos, artistas, jovens, homens e mulheres. Não é exagero dizer que criou o terceiro setor, modernizando o que se entende por assistencialismo, hoje, no país.
Ainda que não tivesse feito nada disso, mereceria ser respeitada da mesma forma, como qualquer outra pessoa na sua posição. Isso vale para Michelle Bolsonaro, que inovou ao discursar na posse do marido usando a Língua Brasileira de Sinais (Libras), e para todas as que vieram antes e que virão depois - inclusive para os homens.
Passou da hora da sociedade compreender que, tal qual ocorre com eles, “lugar de mulher é onde ela quiser”, seja onde for.