Decidido a desenrolar o novelo que liga ancestralmente o fado à música brasileira, o músico e pesquisador gaúcho Henrique Mann está desde domingo passado pela quarta vez em Coimbra, para complementar as pesquisas que faz desde 2011. Ao lado da esposa, a professora de História Leandra Vargas, ele já vinha estudando o fado de uma maneira geral, com mais foco na história do gênero em Lisboa, mas ao conhecer o fado de Coimbra percebeu que havia muita diferença entre os dois.
– Me interessei em saber que diferença era aquela e fui conversar com experts, como o reverenciado maestro Virgílio Caseiro e o historiador António Manuel Nunes, maior autoridade portuguesa em música de Coimbra – conta Mann. – Aliás, lá não é usada a denominação “fado”. Todos a definem como “canção de Coimbra”.
A partir das entrevistas e da leitura de livros desses mestres, entre outros, Mann foi informado da ligação da pianista e maestrina carioca Chiquinha Gonzaga (1847 – 1935) com músicos de Coimbra. E a certa altura da pesquisa, aqui e lá, surgiu uma revelação que espantou os próprios portugueses: algumas letras de músicas populares, tidas como do folclore ou de autor desconhecido, eram poemas do também carioca Casimiro de Abreu (1839 – 1860), filho de um lusitano e uma brasileira. Essa é uma das histórias inéditas que estarão no livro de Mann e Leandra, cujo título provisório é O Fado, a Seresta e a Canção de Coimbra. Pois é, a seresta, uma secular tradição brasileira, seria interessante ver como entra a história. Mas ele prefere não antecipar. Um terço do texto já está no computador, lançamento provável em 2018.
Henrique Mann diz que seu lado de pesquisador, talvez influenciado por Leandra e pela mãe dele, também professora de História, veio à tona quando materializou o que chama de “enciclopédia”: a coleção de 30 fascículos Som do Sul – A História da Música do Rio Grande do Sul no Século XX, lançada em 2002 – e em formato de livro no ano seguinte. O trabalho, com as biografias essenciais de mais de cem nomes, entre outras informações, é visto por ele como um dos mais importantes de sua trajetória.
– Ganhei dois prêmios Açorianos diferentes pela mesma obra, o de Literatura e o de Música. Ainda hoje me procuram de todos os lados querendo saber onde encontrar. No Interior, rádios pautam sua programação com os fascículos, pois neles estão as datas principais envolvendo vida e obra desses artistas.
Faltou um nome no Som do Sul: o de Henrique Mann, que insiro agora, quando o lançamento completa 15 anos. Também em 2017, seu primeiro disco, Quintanares, comemora 30 anos, e o segundo, Porto Alegre Boêmia, 20. Além desses, tem o volume 2 de Porto Alegre Boêmia (1998) e Norte in Sul (2002), mais os livros MPB em Debate (1991) e Retratos da Vida Boêmia (1995). Tocou na noite de 1979 a 96, passou pela maioria dos bares com música ao vivo cantando só música boa de todos os gêneros. Foi coordenador de Música da Secretaria da Cultura de Porto Alegre de 2005 a 2007, criando projetos como Sons da Cidade e Encontrabanda. Hoje está em Portugal, onde já deu aulas sobre música brasileira. O projeto é ficar dois meses. Mas tem sérios planos de viver na Europa. Se for, perderemos um artista culto, versátil e generoso.