Muito provavelmente, nenhuma reação humana se presta para tantas expressões emocionais, quanto o choro. Praticamente se pode chorar por qualquer coisa. Pelo objeto conquistado ou perdido. Pelo amor que partiu de repente e o que voltou quando já não se esperava. Pelo noivado da filha deslumbrada e pelo fim do casamento que já ninguém aguentava mais. Pela biópsia negativa e pelo câncer inoperável. Pela conclusão do Ensino Médio e pela reprovação no vestibular. Pela necessidade de um transplante e pela chamada no meio da madrugada, comunicando que encontraram um doador. Pela notícia da morte do padrinho rico querido que não podia ter morrido e pela descoberta fatídica de que não fora incluído no testamento do miserável, que já foi tarde.
O estímulo ao choro é que difere em cada criatura. Existem pessoas que choram vendo famílias chorando de alegria porque o rebento se classificou para próxima fase do The Voice, enquanto outros põem óculos escuros para que ninguém perceba os olhos secos no enterro da mãe.
Ela me disse: “Se eu pudesse voltar no tempo, só o que queria eram as minhas lágrimas de volta!”
Chora-se da dor física que exige morfina e de felicidade quando ela finalmente alivia. Muito se chora de tristeza, de frustração, de inveja e de ódio. Chora-se do orgulho de ter dito o que merecia e da vergonha de ter engolido. Também se chora de abandono, de solidão, de arrependimento e de remorso. Chora-se sozinho, no quarto escuro e silencioso, e aprende-se a desconfiar do choro espalhafatoso e teatral.
Nunca esquecemos a amizade omitida nem o ombro oferecido para o choro compartilhado. Existem choros que doem na garganta como se houvesse cacos de vidro na saliva, e outros que se resolvem com duas assoadas do nariz.
Com lágrimas, tudo é possível, até se arrepender delas. Isso aprendi com a Ana Luiza. Lembro dela, chorando muito, quando lhe disse que o Hermano tinha por fim morrido, depois de uma longa agonia que começou com pneumonia dupla depois de uma dose de quimioterapia, e evoluiu para a falência de múltiplos órgãos, e todos os seus desdobramentos, com várias tentativas de resgatá-lo. Todas sofisticadas e inúteis. Um mês depois, quando ela veio apanhar o atestado para cobrança do seguro, estava muito mais magra, com olheiras fundas, cutículas negligenciadas e choro engatilhado para mais uma sessão, se houvesse qualquer estímulo. Resolvi poupá-la e falamos de outras coisas, e até do calor que fazia, que assunto mais insosso não há.
Poucos meses depois, cruzamos no supermercado. Estava elegante, de salto alto e maquiada. Antes que lhe fizesse qualquer pergunta, ela desatou:
– O senhor acredita que aquele filho da mãe tinha outra mulher e chamava os filhos dela pelos mesmos apelidos carinhosos com que chamava os meus?
Percebendo que eu não sabia o que dizer, ela se antecipou:
— Eu sei que o senhor tentou o que podia, e acho que até não lhe agradeci tanto quanto devia, mas hoje, se eu pudesse voltar no tempo, só o que queria eram as minhas lágrimas de volta!
Se eu não tivesse ficado tão surpreso, talvez tivesse chorado um choro solidário pela fraude que a tinha feito tanto chorar.