A competitividade deve ser estimulada, porque produz uma energia que nos expulsa da zona de conforto e nos empurra em direção ao nosso limite, que é onde descobrimos quem de fato somos. As exigências serão sempre exacerbadas, porque sem desafios nunca saímos da mesmice, esta condição amorfa que aprisiona e deforma o espírito, tornando-o incapaz de sentir mais do que pena de si mesmo. E por esta avenida se chega, sem surpresas, ao protótipo da geração mimimi, que se encantou com a informação de que a infância é só para brincar e gostou tanto da ideia, que nunca aceitou que ela terminasse; aos 30 anos, ainda mora na casa dos pais e sistematicamente reclama se ninguém foi capaz de arrumar-lhe a cama.
Este tipo se diz socialista, mas se atrapalha se alguém perguntar o que isso significa, sente uma energia indescritível quando abraça uma árvore, sonha morar no Tibete, faz de conta que se interessa pelos direitos humanos, se compadece das crianças pobres de Burkina Faso, mas nunca se oferece para um voluntariado na pátria-mãe. Como exagero de tristeza cansa, só viaja em classe executiva, pelo menos enquanto os pais viverem para assegurar-lhe uma mesada que inclua o acesso ilimitado ao cartão de crédito, e as maravilhas da cibernética com planos de renovação automática e débito em conta. É impossível esperar competitividade de quem acredita que buscar o corte de cabelo mais bizarro e cobrir o corpo das tatuagens mais grotescas torna-o merecedor de algum troféu.
Como esse modelo de jovem se generalizou, vamos ter que apegar-nos às exceções se quisermos produzir uns tipos vencedores, que daqui a algumas décadas possam sentar com os netos empoleirados nos joelhos e perceber o quanto eles estão orgulhosos das histórias que o avô tem para contar.
Lamentavelmente, somos muito mais afeitos a reverenciar os que conseguiram vencer do que a batalhar para copiá-los. Tiger Woods, que era só um jovem recolhedor de bolas no clube de golfe, teve de vencer a barreira étnica para se transformar no seu maior campeão. Ele cunhou a famosa frase:
— Quanto mais eu treino, mas sorte eu tenho!
Na semana da trágica morte de Kobe Bryant, as TVs americanas reproduziram suas proezas à exaustão, e havia nos comentários o deslumbramento da idolatria e, de quando em vez, algum ressentido (“Também ganhando o que ele ganhava, até eu faria sucesso!”), como se o sucesso tivesse chegado antes do trabalho.
Gostei de um debate entre dois especialistas da NBA, sobre quem tinha sido melhor, ele ou Michael Jordan. Depois da apresentação dos números impressionantes, que comparavam cestas, assistências, rebotes, desarmes, títulos e troféus ao longo da vida, um dos comentaristas argumentou que preferia o Jordan por ser mais vertical, e achava que o Bryant dava toques demais na bola. Ao que o outro, mais velho, respondeu:
— Pode ser. A propósito, um dia ouvi de um crítico que Mozart colocava demasiadas notas nas suas composições!
A cara de surpresa do mais jovem me deixou com a impressão de que ele não estava se lembrando de ninguém com este nome na liga de basquete americano.