Eu nunca viajo sem livros. Sempre levo um pedaço de minha biblioteca. Ainda não tive coragem de comprar um Kindle. Eu sei que é mais prático, que você pode armazenar milhares de livros e tal. Mas sabe, eu preciso deles. Preciso deles fisicamente comigo. Como uma espécie de proteção. Um modo de não me sentir só, ainda que esteja acompanhado de alguém.
Recentemente terminei de ler o livro Encaixotando Minha Biblioteca, do escritor argentino Alberto Manguel, e me fez ter mais apego aos meus livros físicos. A obra traz uma reflexão do autor sobre sua biblioteca de mais de 35 mil livros. Ao ter que se mudar da França para Nova York, Manguel faz digressões sobre sua relação intelectual e afetiva com os livros.
As perguntas mais comuns para quem tem uma biblioteca em casa são: você já leu todos? Por que você não doa alguns? Não acha que é um exagero ter tantos livros assim? Para quem gosta de livros, estes questionamentos não fazem muito sentido. Primeiro que parece óbvio que é impossível ler todos os livros quando se tem um acervo relativamente grande, e para quem gosta de livros, a presença deles na estante é tão importante quanto lê-los. Segundo que quem gosta de livros é também um colecionador, portanto, doar, por mais altruísta que seja este gesto, torna-se inconcebível.
Tenho uma memória afetiva dos livros da minha estante, lembro de como cada um daqueles exemplares chegou até mim: os que comprei, os que ganhei, os que li, os que ainda poderão ser lidos, os que sei que nunca irei ler. Todos estão lá, não apenas ocupando espaços nas prateleiras, mas fazendo parte de mim. Porque foram os livros que me constituíram e me trouxeram até aqui.
Ter uma biblioteca é construir uma moradia para a literatura. A literatura me ofereceu um modo de viver. Me fez ver o mundo com mais honestidade e delicadeza. Acho justo que os torne um dos elementos centrais da minha vida. Me comovo quando vejo alguém diante de uma estante e lê as lombadas, depois retira um exemplar com a ponta dos dedos, folheia-o, lê uma frase aqui, outra ali, decide por ele, ou o coloca de volta no lugar. Parece um gesto sem importância, mas não é.
Certa vez, o crítico Antonio Candido disse que quem gosta de livros deve fazer alguma loucura pelo menos uma vez na vida por causa deles. Eu já fiz. Certa vez, parei de pagar a faculdade onde estudava para comprar livros (não recomendo essa loucura), tal era a minha paixão por eles. Em suma, ter uma biblioteca é uma declaração de amor aos livros.