A presença de militantes bolsonaristas em frente aos quartéis das Forças Armadas desperta sentimentos dúbios entre os fardados. Ao mesmo tempo em que sua vaidade é estimulada, eles têm a rotina totalmente alterada pelo barulho. Os mais sensatos temem também (com razão) que culminem em algum episódio violento. Por isso, reina o silêncio entre o alto oficialato.
Militares graduados desabafaram com o colunista que dois fatos da semana atrapalharam um pouco a recomendação dada aos subordinados pela cúpula das Forças Armadas, de que é preciso respeitar a vitória do eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Um deles é a carona que o petista pegou para ir ao Egito, na conferência do clima. Usou o jatinho de um empresário que já esteve preso pela operação Lava-Jato.
- Fica a sensação de que o Lula não aprendeu nada. Era hora de aceitar favor de empresário, ainda antes de assumir? - questiona um oficial graduado.
O outro fato ressaltado é a reação do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), ao ser perseguido insistentemente com questionamentos por manifestantes bolsonaristas, ao sair de uma palestra em Nova York (EUA).
- Perdeu, mané. Não amola - respondeu Barroso, irritado.
Os generais ouvidos pela coluna consideram a reação de Barroso inapropriada, por dois motivos: a linguagem não parece de um ministro do STF, mas de um militante político. Além disso, dá margem à suposição de que Barroso se alinha ao vitorioso Lula. Mesmo que isso não seja verdade e ele tenha apenas reagido a provocações, o fato se encaixa à perfeição no discurso bolsonarista de que o Supremo não é isento e, sim, lulista. Mesmo que existam ministros indicados por Jair Bolsonaro, lá.
Os dois episódios despertaram tuítes de generais da reserva, que sempre são lidos com atenção. Tudo isso se reflete no comportamento do oficialato médio das Forças Armadas, que acaba sensibilizado pelos protestos que, claramente, pedem uma ilegalidade: a intervenção dos militares para impedir a posse de Lula. Não custa lembrar que na Venezuela, em 1992, Hugo Chavez era um mero coronel quando tentou um levante armado, sufocado. Foi preso e, anos depois, se elegeu presidente, governando de forma autoritária.
Os militares com quem falei têm perfil legalista, mas temem que alguma fagulha possa incendiar os ânimos. Algo do tipo confronto entre manifestantes, ferimentos, mortes. Isso seria o caldo ideal para os que defendem um regime de força.