Até o final de novembro, Rio Grande contabilizava 23 homicídios no ano de 2021. De repente, entre 24 daquele mês e o início de março de 2022, ocorreram outros 26 assassinatos. Ou seja, em três meses, mais mortes que em quase todo o ano passado.
Qual a explicação? A delegada Lígia Furlanetto, chefe regional da Polícia Civil, requisitou e conseguiu ajuda de uma força-tarefa do Departamento de Homicídios para elucidar os casos. Os policiais descobriram que a maior parte do banho de sangue (19 das 26 mortes) envolve uma briga entre as facções criminosas dominantes na Zona Sul do Estado: Os Manos (de amplitude estadual) e Os Tauras (muito forte em Rio Grande, Pelotas, Santa Vitória do Palmar, Jaguarão e Chuí).
As duas facções eram aliadas no Sul do RS. O pivô do racha que levou às mortes em Rio Grande é um plano de fuga da Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), descoberto em 28 de outubro, quando PMs encontraram num carro abandonado um croqui com mapa completo daquele presídio. O desenho mostrava homens armados explodindo caminhões e invadindo a penitenciária, para resgatar dois líderes de quadrilha de Rio Grande. Os nomes deles estavam escritos no papel. Isso deixou as autoridades de cabelo arrepiado e foi cogitada a remoção dos dois quadrilheiros para presídios de segurança máxima, longe do Rio Grande do Sul.
Só que o plano era falso. O delegado de Polícia em Charqueadas, Marco Schalmes, fez paciente investigação e descobriu que o veículo fora furtado no Vale do Sinos. As três pessoas que o conduziram até Charqueadas foram localizadas. Ao serem interrogadas, uma delas, familiar de um preso, admitiu que o plano de fuga era inventado. Esse presidiário é inimigo da dupla de traficantes cujo nome estava nos croquis.
Ao descobrir que fora alvo de um complô, os dois apenados da Pasc iniciaram uma retaliação. Conforme a delegada Lígia, a maior parte das mortes envolve represálias mútuas entre a quadrilha dos que forjaram o plano de fuga e dos que seriam injustamente imputados nessa falsa escapada. Isso está registrado em depoimentos e telefonemas.
As oito prisões deflagradas nesta sexta-feira (4) devem estancar, por hora, a matança em Rio Grande. Pelo menos os policiais fizeram a sua parte.