A população aplaude policiais enérgicos. Algo como uma figura paterna a aplicar “corretivo” nos desordeiros. Essa é uma das razões pelas quais, quando o governo demora a agir, a comunidade paga para se livrar de crimes – estimula e contrata milícias para resolver o problema. O exemplo clássico é o Rio de Janeiro, onde milicianos substituíram traficantes como o poder constituído em muitas favelas.
O que a comunidade demora a perceber é que o miliciano não apenas substitui o criminoso, mas acaba por copiar os seus métodos. Não pede, manda. Não solicita contribuição, extorque na cara dura. Não prende, mata – com muita sorte, apenas espanca. E não pense que apenas criminosos são o alvo. Muitas vezes a vítima é apenas um sujeito que reclamou de algo errado.
No Rio Grande do Sul milícias são exceção, não regra. Os casos comprovados de envolvimento de policiais em forças paramilitares de punição, extorsão e execução de pessoas costumam ser investigados e reprimidos. Aconteceu em Pelotas (onde um grupo de vigilantes e ex-policiais espancava suspeitos como método cotidiano), aconteceu na zona norte de Porto Alegre (onde um grupo de PMs teria se aliado a uma facção para extorquir e matar integrantes de outra) e, agora, tudo indica que o fenômeno se repetiu em Alvorada.
Conforme levantado pelo colega Vitor Rosa, 27 PMs que atuam em Alvorada foram indiciados por corrupção, extorsão, apropriação de bens alheios e, em alguns casos, por formação de milícia. Nada indica que agiam todos em conjunto: a investigação aponta que os focos de contaminação eram dispersos, por isso nem todos são chamados de “milicianos” no inquérito.
Conforme a investigação, a prática mais comum era extorquir traficantes, apreender drogas e depois colocá-las na mão de outros traficantes, para revenda e obtenção de lucro. Os espancamentos eram cotidianos. Vai ter gente dizendo: tá, mas eram criminosos…
E quando a vítima não é criminosa? Há o caso de um sujeito agredido a pauladas, roubado (tiraram dinheiro dele), após se surpreendido numa caminhonete, sem documento de habilitação. Era um delinquente? Então teria de ser conduzido a uma delegacia. Não vamos saber, porque ele não foi preso. Foi espancado, assaltado por policiais e liberado sob ameaças, caso revelasse o ocorrido, conforme aponta a investigação da BM. Vale isso, cidadão?
Claro que tudo está em apuração e deve ser comprovado na Justiça. Caso confirmado, será o maior caso de corrupção policial numa só investigação de que me recordo no Rio Grande do Sul, em mais de 35 anos de jornalismo.