O excesso de chuva trazido a reboque do fenômeno El Niño atinge, neste momento, as duas safras de grãos do Rio Grande do Sul. A produção de inverno, com o trigo como a principal cultura, está na parte final do ciclo e tem na umidade além da conta um inimigo com potencial de afetar volume e qualidade da colheita. No ciclo de verão, as precipitações recorrentes acabam por adiar o momento do plantio (por ora, algo que ainda pode ser revertido).
Os efeitos do clima sobre as lavouras do Estado foram tema de entrevista com o diretor técnico da Emater, Claudinei Baldissera, no programa Campo e Lavoura da Rádio Gaúcha.
Como a Emater acompanha o cenário de chuva em excesso?
Vivemos um período climático que atinge a safra de inverno, que se encaminha para o final, e a de verão, que estamos dentro do zoneamento de plantio. Temos esses episódios de chuva importante e que têm impactado bastante o trigo, atrasando a colheita e colocando a qualidade do grão colhido como inferior à safra passada, que foi excepcional. Nas culturas de verão, temos avanço de 65% na área plantada de milho, que não está distante do ano passado. Mas em alguns municípios, chuvas intensas prejudicam uma fração de germinação e levam a processos erosivos. Em menos de 24, 36 horas, temos chuva de 230 milímetros, às vezes, 250. Não tem solo, por melhor manejado que seja, que consiga absorver tamanha quantidade de água.
Qual o maior problema causado pela umidade no trigo?
Do final do enchimento do grão ao amadurecimento, as chuvas têm sido intensas e associadas com poucos dias de sol, umidade e calor, provocando o surgimento de doenças fúngicas, como a giberela. Até antes da fase de enchimento de grão ocorria o excesso de umidade, que dificultava a entrada de máquinas para os tratamentos. É um acúmulo em praticamente toda a fase de desenvolvimento e que culmina com a final. O produtor não consegue colher porque a umidade de solo e planta não favorece. Quanto mais chuva, mais prejudicada é a qualidade.
É possível dizer que a colheita de trigo será diferente da projetada no início da safra?
Sim. À medida que a colheita atrasa, e o trigo fica na lavoura, perde qualidade. A mensuração que se tem do PH (peso hectolitro, uma medida do cereal) do trigo tipo 1 é o que passa do PH 78, e são poucas as lavouras que estão atingindo.
A preocupação é com as que ainda não foram colhidas. Muitas estão em ponto verde, e recebendo sucessivas chuvas e pouco sol. Muito provavelmente, são lavouras que não apresentarão qualidade tipo 1.
Há algo que o produtor possa fazer para evitar danos no trigo?
À medida que as condições de tempo, sol, umidade, permitam, efetuar a colheita o mais rápido possível. Em cenários bons (de tempo), em praticamente três semanas, o RS colhe a safra dele.
Como o produtor pode se preparar para conduzir a safra de verão da melhor maneira possível, com essa perspectiva de El Niño no horizonte?
Efetuar o plantio dentro das janelas de zoneamento é o principal cuidado, e os tratamentos fitossanitários adequados. A parte boa desse movimento inverso à estiagem, com o fenômeno das chuvas, que têm uma cirva que vai até o final do ano, é a reposição dos níveis hídricos, de rios e reservatórios e que vínhamos acumulando déficit em uma sequência de vários anos. Essas chuvas trouxeram esse alento importante. Isso impacta diretamente na safra de verão. Os cuidados são de controle de erosão, de manejo adequado do solo e plantio dentro das janelas indicadas no zoneamento de cada região e tratamento fitossanitário.