A paixão pela vitivinicultura o enólogo Bruno Motter, 33 anos, herdou da família. Foi em Caxias do Sul, onde ele nasceu, que o avô deu o primeiro passo, com os vinhos de mesa. No anos 2000, o pai adquiriu terras em Alto Feliz, plantando a semente da vinícola Don Guerino. E, 11 anos depois, Bruno passou a responder pela parte técnica da marca. Agora, aos 33 anos, colhe uma safra de sabor especial: acaba de ser escolhido o enólogo do ano pela Associação Brasileira de Enologia (ABE). Em entrevista à coluna, ele fala um pouco da trajetória e dá dicas de como o consumidor pode tirar o melhor proveito possível da produção nacional. Confira trechos.
O que o levou a buscar a formação em Enologia na Argentina? Tem algo que tenha aprendido lá e carregue até hoje em seu trabalho diário?
O objetivo de estudar lá era voltar com novas ideias, tentar somar coisas diferentes ao projeto da nossa vinícola, que estava ficando pronto naquele momento. A Argentina, na questão vitivinícola, tem um renome internacional, uma grande área de cultivo, é referência. E o estudo lá é muito voltado à gestão, não somente à técnica, mas com uma visão mais global à época (estudei de 2007 a 2011).
Qual o papel do enólogo na produção do vinho? E a diferença que tem em relação ao trabalho do sommelier?
São papéis diferentes que o vinho une. O enólogo é o responsável por acompanhar todo o processo de elaboração do vinho, desde decisões de manejo do vinhedo, mapear as áreas, ponto de colheita, seleção das uvas, implantação de novos vinhedos... Depois, claro, a parte que mais aparece é a de elaborar o vinho, receber a matéria-prima na vinícola, transformar a uva em vinho e conduzir a elaboração. E, mais do que tudo, precisa ter sensibilidade durante a elaboração, acompanhar a evolução dentro de um princípio até o engarrafamento do produto. O enólogo tem de ser aquela pessoa que dá personalidade ao projeto, acompanha e mostra o potencial de cada região, o terroir, as caraterísticas do clima, do solo. Já o sommelier vai muito dali para a frente. Entende bastante de regiões vitivinícolas, de terroirs, de variedades, mas é muito voltado ao serviço e à harmonização do vinho. Vai indicar, conduzir o consumidor, propor a experiência.
Você falou que o enólogo dá a personalidade ao projeto da vinícola. Qual é a do Bruno, que se reflete na produção da Don Guerino?
Ah, eu sou um pouquinho chato (risos). Gosto das coisas bem alinhadas. Minha mãe fala que eu sou perfeccionista. É que os detalhes aparecem na taça e desde o vinhedo. Enfim, decisões de manejo, cuidados no processo de elaboração. Os detalhes no processo vão aparecer no vinho. Essa é minha característica: ser atento aos detalhes.
Como é a rotina do enólogo?
O trabalho dentro de uma vinícola é interminável, você acaba uma vindima e, até iniciar uma nova, nunca esgota o serviço. Estou de segunda a sexta na vinícola, acompanhando os processos. Como a nossa propriedade tem os vinhedos ao lado da vinícola e tem a parte de turismo, acabo me dividindo entre o acompanhamento da condução dos vinhedos, manejo de parcelas, de variedade e de vinho e, nos tempos livres, recebendo amigos e clientes na vinícola.
A produção brasileira está em que etapa? Há espaço para novas variedades, para a entrada de coisas novas?
O momento do vinho brasileiro é um momento de maturidade, de buscar identidade à região. Em vinhos temos castas emblemáticas, tradicionais. Fala-se na merlot, no sul do Brasil, mas hoje existem várias regiões brasileiras, com diferentes castas. Tem a cabernet franc voltando com força, os espumantes consolidados. Mas, claro, é muito da liberdade de cada projeto. Nós, da Don Guerino, trabalhamos bastante com a uva malbec, tem a merlot, a cabernet franc também. Mas, mais do que tudo, é buscar transmitir o que a nossa região tem de virtudes: o frescor, a acidez, vinhos leves, que entregam bastante o que todo o ano a gente consegue fazer. Novas variedades é muito aberto a cada projeto, mas a gente não deve se fechar. Porque tem uma história de novo mundo, de poder ousar e não precisar copiar o que os países tradicionais fazem. E, sim, quem sabe criar um estilo, um corte brasileiro, novas coisas que sejam autênticas do Brasil.
Que dicas daria ao consumidor que busca o vinho brasileiro?
Primeiro, que devem fazer a decisão de compra com base no gosto pessoal. Um vinho caro pode ser premiado, mas às vezes não agrada a todos os consumidores. Entender isso é importante na hora da compra, seja um vinho leve ou mais encorpado. Em base a isso define se gosta ou não de vinho com maior estágio em madeira. Uma das vantagens do vinho brasileiro é ter safras frescas, que não vai estar atravessando a fronteira em contrabando, falsificações. E valorizar o produto brasileiro. O Brasil já é consagrado no âmbito nacional e internacional. Se equipara em qualidade a qualquer vinho do mundo. Estamos em patamar de altíssima qualidade.