A suspensão das vendas de fertilizantes pela Bielorrússia para o Brasil é o mais recente capítulo das consequências imediatas da guerra. O país do Leste Europeu, vizinho da Rússia e da Ucrânia, é um dos fornecedores brasileiros do insumo – responde por 3,4% dos cerca de 80% do insumo que precisa ser trazido de fora. Está, ao lado de russos e canadenses, entre os maiores fornecedores de potássio: juntos, respondem por 91% do fornecimento brasileiro.
— A interrupção total do fluxo de exportação de fertilizantes russos ao Brasil, assim como para a grande maioria de outros países do mundo, é somente uma questão de tempo. Mesmo que o país não suspenda as vendas externas, as sanções econômicas impostas à Rússia e os gargalos logísticos tendem a interromper o fluxo — pondera o consultor em agronegócios Carlos Cogo.
Atento às ondas que devem atracar em águas gaúchas a partir desse cenário, a superintendência do porto de Rio Grande se reuniu nesta quarta-feira (2) com empresas que operam no terminal. O superintendente Fernando Estima pontua que fertilizantes e contêineres serão os dois segmentos mais diretamente impactados:
— O desafio nos próximos dois, três dias é tentar identificar melhor os efeitos físicos para poder agir sobre eles. Das rotas que estão canceladas, precisamos saber se afetarão outras cargas.
Embora seja cedo para um diagnóstico mais claro, Estima está certo da influência na agricultura e nos preços de alimentos, trazendo pela frente “dias desafiadores”.
A começar pelo plantio da próxima safra de inverno no Rio Grande do Sul. As sementes serão lançadas depois de uma produção de verão de prejuízos. A valorização da cotação do trigo neste momento anima, mas o mercado é volátil e há um longo período até a próxima colheita. Por ora, a única certeza é a de que os custos ficarão maiores.
— Lamentavelmente, a decisão (da compra) do adubo se dá nos próximos dois meses, mas (o agricultor) só venderá a produção em dezembro — alerta Eduardo Condorelli, superintendente do Senar-RS.
Maio costuma ser o de maior volume de compras de fertilizantes por parte dos produtores gaúchos. Segundo o superintendente do porto, há uma projeção de que o Estado já tenha volume de fertilizante que atenderia de 25% a 30% da necessidade anual.
Analista da Safras & Mercado, Maísa Romanello lembra que, depois de um 2021 de oferta restrita e preços elevados, havia uma perspectiva de equilíbrio para este ano. Mas essa expectativa foi interrompida pelo conflito e trará impacto sobre preços e volume no mercado.
— A recomendação é se planejar, procurar fornecedores. Tem produtores que já fecharam a compra, mas há a indefinição da entrega – pondera Maísa.
Pressão de custos também à mesa
Além do fornecimento de fertilizante, os dois países envolvidos no conflito têm um papel importante em outros produtos agrícolas. A Rússia é a maior e a Ucrânia a quarta maior exportadora de trigo do mundo. Desde o início do conflito armado, isso vem afetando as cotações do produto. Nesta quarta-feira (2), os contratos com vencimento para maio tiveram alta de 7,62% na Bolsa de Chicago, fechando a US$ 10,59 o bushel (medida equivalente a 27,21 quilos), o maior nível em 14 anos.
Para o consumidor, o efeito virá principalmente do fato de o Brasil não ser autossuficiente na produção do cereal, precisando trazer de fora a matéria-prima para atender à demanda da indústria. O principal fornecedor brasileiro é a Argentina, onde a régua das cotações também já subiu. Lembrando que, na importação, a moeda é o dólar – fazendo da variação cambial um fator de formação de preços.
Tradicionalmente, o RS tem uma condição diferente do país: tem produção de sobra para atender o consumo. Neste ano, no entanto, os estoques ajustados obrigarão a ampliar as importações, conforme projeção da indústria local.