Uma das instituições financeiras consultadas pelo Banco Central no Rio Grande do Sul para preparar o relatório semanal Focus, a Quantitas Asset revisou novamente as suas projeções para 2020. A pandemia vem deteriorando as expectativas econômicas. Confira os números enviados para a coluna pelo economista da gestora de fundos de Porto Alegre João Fernandes:
PIB: projeção piorada -2,8% para -4%
Inflação oficial, medida pelo IPCA: de +1,6% para +1,4%
Taxa de juro Selic: mantida em 2,75% no fechamento do ano. Atualmente, está em 3,75%.
A revisão do PIB foi forte, mas era esperada, com tudo que está acontecendo. O que pesou nessa projeção?
João Fernandes - Realmente, esse ano foi de reduções substanciais no cenário que a gente trabalhava pelas principais variáveis econômicas. Acho que uma das principais variáveis que a gente alterou o cenário foi, justamente, o crescimento do PIB para 2020. Uma contração da economia que está sendo impulsionada, principalmente, pela quarentena para conter o contágio do vírus. Os segmentos que estão sendo mais afetados são de consumo, tanto de bens como serviços. A diminuição de circulação e até o fechamento de alguns estabelecimentos durante esse período terão um impacto muito substancial na atividade. Os mais óbvios são os serviços como alimentação fora do lar, lazer, transporte, mas também o comércio geral. Isso é uma parcela de atividade que estaria sendo gerada agora, no segundo trimestre, e que vai ser perdida. Ainda que uma parcela da atividade retome quando a quarentena terminar, muita coisa que não foi consumida, não voltará a ser. Ainda que algumas decisões de consumo estejam sendo postergadas e não anuladas, o consumo de alguns bens como uma perenidade menor não volta. Isso justifica uma atividade mais fraca.
E em relação à inflação, que está baixa. São os combustíveis? A demanda baixa?
É historicamente baixa e ela se baseia em dois grandes fatores. Um deles é a queda substancial que a gente está vendo nos mercados internacionais nos preços de commodities como petróleo, minério de ferro e produtos agropecuários, como soja. Todos esses produtos tiveram uma queda de preço muito forte com a ameaça do coronavírus. Além da gasolina, isso se traduz em outros combustíveis, como o etanol, que acompanha o preço da gasolina por paridade. Ele também acaba caindo, contribuindo para o impacto negativo na inflação. Fora esses dois itens, outras commodities também têm seus impactos. Por exemplo, a queda do preço do algodão impacta o vestuário aqui no Brasil para baixo. Queda de commodities agrícolas, em geral, impactam para baixo o preço dos alimentos. Outra grande razão para uma inflação tão baixa é o efeito de demanda. Você está com uma das maiores recessões que o Brasil já passou, isso gera um efeito muito substancial sobre o consumo, até porque você terá um aumento muito grande do desemprego. Para 2020, a gente espera que o desemprego alcance patamares entre 13,5% e 14%. Mesmo no segundo semestre, conforme a atividade se recupera, a depressão da demanda precisa de um tempo até voltar ao normal. Então, o desemprego persiste por um alguns meses, ele não volta tão rápido quanto, por exemplo, as decisões de investimento, de produção e, posteriormente, de consumo. A contratação de pessoal novo é uma etapa posterior no ciclo de recuperação. Você acaba passando o ano todo com uma demanda muito deprimida, o que significa a pressão para baixo dos preços, porque as pessoas vão comprando. O consumo de bens e serviços vai continuar em um patamar baixo, mesmo a partir do momento em que se tenha uma recuperação no segundo semestre. Realmente, vai ser mais para 2021, quando vamos começar a ter uma queda mais substancial do desemprego, voltando para os níveis em que estávamos no final do ano passado. Também será quando a questão de preços voltará a aparecer e a inflação começará a acelerar para algo mais próximo das metas. Para 2020, o cenário é de uma inflação mais baixa. O dólar mais alto, claro, acaba contribuindo para cima em alguns preços de bens importados, mas não compensa. Porque, mesmo que o custo dos bens importados esteja maior, a demanda está muito baixa. As pessoas não estão consumindo esses bens no mesmo nível que estavam antes da recessão.
Aproveitando, confira as projeções do relatório Focus divulgado nesta segunda-feira (20):
PIB: reduzido para -2,96% (corte ocorre há 10 semanas)
IPCA: reduzido para +2,23%
Dólar: elevado para R$ 4,80
Taxa de juro Selic: reduzida para 3%
Colunista Giane Guerra (giane.guerra@rdgaucha.com.br)
Colaborou Daniel Giussani (daniel.giussani@zerohora.com.br)
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