O detalhe terrível da pandemia não é a força mortífera do novo vírus. A História da humanidade está cheia de exemplos em que os mais frágeis derrotaram os fortes. Já a Bíblia mostrou como o pequeno David venceu o gigantesco Golias.
O apavorante, agora, é que a nova peste é invisível. O coronavírus ataca mas não sabemos de onde agride. Esquiva e silenciosa, a peste tem distintas formas de atacar. O contágio pode vir de quem seja assintomático e não exteriorize sequer coriza ou tosse, mas já transmita o vírus. A guerra atual envolve o planeta inteiro (combate-se até em terra indígena) mas não sabemos, com exatidão, onde está o inimigo nem como ele é.
O desenho do vírus é apenas uma caricatura molecular, que não mostra como se move ou agride do seu esconderijo. E tudo que se esconde é sórdido, seja o que for. É como dormir abraçado a quem quer nos matar e, assim, jamais despertar.
Até aqui, só a radiação nuclear mostrava esse poder destrutivo invisível – sem odor nem cor ou qualquer aparência, nem líquida sólida ou gasosa, matando de chofre ou lentamente. No contágio nuclear, porém, há um centro gerador que podemos identificar, seja bomba atômica ou um aparelho de Raio X avariado.
O novo coronavírus é solerte e perigoso por não ter nada identificável. Pode estar em qualquer lugar e se expandir. Por isto, nunca pode ser visto como "gripezinha", a não ser por míopes de alma e consciência. Ou por quem pense que vê, quando, de fato, inventa fantasmas que nos desviam do perigo concreto.
O horror, porém, permanece, sem pedir licença a quem diz que não existe. E só aguarda o invisível momento do novo ataque a esmo, seja a quem for, príncipe ou mendigo.
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Toda experiência de horror leva a aprender com o horror em si. E nos traz aquilo que a alegria miúda do dia a dia não nos ensina.
Hoje, o "fica em casa" faz a família conviver de novo, com pais e filhos voltando a conhecer-se. Ou com casais se amando de novo ou entendendo porque se desentendem. Esta volta ao lar pode significar o retorno a uma convivência amorosa que a balbúrdia da sociedade de consumo apagou ou diluiu.
Mas isto é restrito a faixas ínfimas da população. A grande maioria não pode ficar em casa, mesmo sabendo que isto seria eficaz contra o vírus. Abençoados sejam, portanto, os que têm de seguir trabalhando seja onde for – hospitais, farmácias, lavouras, mercados, indústrias e comércios essenciais ou na segurança pública e prisões, pois a vida continua no ritmo de subsistir e vencer.
Só a união solidária, em que cada um zele pelo outro, pode derrotar o invisível que nos espreita até numa folha de papel… se não lavarmos as mãos.