Temos tantos governantes, que às vezes não sabemos a quem atribuir o que nos falta. Ao prefeito, ao governador ou ao presidente e aos que, junto a ele, nos mandam lá de Brasília? Numa República federativa, um governante complementa o outro e tudo deveria desembocar na harmonia em função da população. Desde a posse de Bolsonaro, porém, tudo mudou. A cada dia, o presidente se atrapalha na mania de governar pelo “tuíter” ou à saída do Palácio da Alvorada. Se fosse “chef” de cozinha, confundiria caviar com feijão, ambos pretos e com bolinhas...
O país profundo sumiu das preocupações. Bolsonaro especializou-se em medidas fáceis. Proibiu o radar nas estradas e abriu portas a acidentes e mortes. Nega os dados do Instituto de Pesquisas Espaciais sobre meio ambiente. Ou, ao abordar a violência, encara coisas sérias na contramão do razoável. Agora, chamou de “herói” o ex-policial Adriano da Nóbrega, chefão de uma das “milícias” que, no Rio de Janeiro, compõem um Estado paralelo que governa pelo terror e a chantagem, além de investigado pelo assassinato da vereadora Marielle Franco, tempos atrás.
Imprensa, rádio e TV já detalharam a promíscua relação política de Adriano com um dos filhos do presidente, que (como deputado) lhe concedeu as mais altas condecorações do Estado do Rio. O “miliciano” e matador de aluguel foi morto dias atrás, pela polícia da Bahia e o presidente da República tachou o governador baiano de “bandido da polícia do PT”.
Foi a gota d’água a transbordar o copo. Num manifesto, 20 governadores de diferentes partidos pediram que Bolsonaro “observe os limites institucionais” e exigiram “equilíbrio, sensatez e diálogo no interesse do povo”. O governador Eduardo Leite foi um dos assinantes, junto aos governadores de São Paulo, Rio e Distrito Federal.
É a segunda rebelião contra o presidente. Em maio de 2019, governantes de 13 Estados, mais o do Distrito Federal, repudiaram o decreto de Bolsonaro facilitando o porte de armas e venda de munição, por incentivar a violência. O decreto foi, depois, suspenso pelo Senado.
Semanas atrás, num gesto publicitário para calar os protestos da Europa pelo descaso ambiental do governo, Bolsonaro subordinou o Conselho da Amazônia ao vice-presidente, mas dele excluiu os governadores da própria região, até então membros plenos.
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Os governadores não se rebelam a esmo, nem por diferenças partidárias. Foram levados ao protesto pelo papel subalterno a que foram relegados desde que o sentido igualitário da união federativa foi substituído (no Planalto) pela visão do mando único.
É absurdo pretender que o “tuíter” substitua o diálogo. Toda ideia sem contrapartida ou debate é imposição que destrói a sociedade e nos faz párias.