Nas ocasiões em que entrevistei Ivo Bender (1936-2018), costumava perguntar-lhe sobre o fato de suas peças serem pouco encenadas entre nós. Ivo não conseguia disfarçar a frustração, mas tinha um diagnóstico bastante preciso: “No momento, o teatro que interessa (aos artistas) é aquele que é improvisado sobre um romance ou conto. Ou, então, aquele que é criado por meio de exercícios durante os ensaios”. Com a saída de cena de Bender, encerra-se uma época na dramaturgia no Rio Grande do Sul.
Sua exuberante obra dramática, que está distante não apenas de nossos palcos como também de nossas livrarias, coincide com um momento de mudança no lugar do texto na encenação, no Brasil e no mundo. É quando os grupos e diretores começam a se envolver com novas formas de produzir dramaturgia e de levá-la à cena. A muitos deles, a peça pronta – não apenas as de Bender, mas qualquer uma – parece algo distante, fria. Preferem recriar outros textos, a exemplo de romances ou teses filosóficas, ou construir a dramaturgia em sala de ensaio, como bem notou nosso autor. Os mais precipitados chegaram a decretar a morte do texto no teatro, mas logo veio a turma do deixa disso, colocando panos quentes. Pois bem.
O fato de agora tudo ser texto do ponto de vista do teatro não explica, por si só, a ausência de Ivo Bender. Porque continuamos assistindo a montagens baseadas em dramaturgia “pronta”, mesmo que recriada, recortada, misturada e colada de novo. Talvez seja um hiato geracional. Talvez seja difícil valorizar as coisas nossas. Vai saber. Qorpo-Santo precisou de um século para se tornar cult, e mesmo assim contou com a validação do centro.
Falta-nos uma noção de história, perceber a linha evolutiva que liga os autores esquecidos do século 19 a Diones Camargo e às novas autorias femininas e negras. Há uma riqueza nesse diálogo que ainda não aconteceu. Talvez aí exista um lugar para Ivo Bender, Carlos Carvalho, Vera Karam. Precisamos martelar a carpintaria teatral dessa trama.